As férias são, para muitos casais, uma oportunidade de reforçar laços, partilhar momentos e realizar os planos adiados pelas exigências do quotidiano. No entanto, para outros, este período de descanso revela-se como um momento de tensão e de confronto, culminando, em muitos casos, em separações ou divórcios.
Vários estudos têm demonstrado que o período pós-férias, seja após o verão, o Natal ou o Ano Novo, é particularmente fértil em pedidos de divórcio e separações. Nos consultórios de psicólogos, terapeutas de casal e advogados, o aumento de pedidos de ajuda é notório logo após estas épocas festivas. Mas afinal, o que explica esta tendência de separações conjugais após as férias?
Em declarações ao Viral, Luana Cunha Ferreira, psicóloga e terapeuta familiar, esclarece algumas das razões que podem justificar esta realidade.
Problemas “adormecidos” emergem, levando a separações
As férias ou o Natal são períodos de pausa que interrompem a rotina habitual e proporcionam aos casais mais tempo juntos, algo que pode, paradoxalmente, intensificar os problemas já existentes na relação. “São momentos atípicos que saem da rotina, em que se criam novas dinâmicas e as pessoas passam mais tempo juntas”, refere Luana Cunha Ferreira. Esse tempo adicional pode fazer com que conflitos ou tensões subjacentes venham à tona, com as pessoas forçadas a lidar com questões emocionais e relacionais que, no dia a dia, conseguem ignorar.
A psicóloga destaca que, nestes momentos, muitas vezes, emerge uma maior consciência da “elevada tensão, desencontros e, em alguns casos, da falta de conexão ou até de desejo”. Quando há um distanciamento prolongado, o simples facto de estarem mais tempo juntos durante as férias não é suficiente para restaurar a ligação emocional, o que acaba por expor as fragilidades da relação, levando a separações.
Desigualdade nas tarefas com os filhos mais evidente
Nos casais com filhos, as férias podem ser particularmente desafiantes, já que a responsabilidade de cuidar das crianças, que durante o período escolar está parcialmente delegada, recai inteiramente sobre os pais. Luana Cunha Ferreira explica que, durante as férias, “o facto de os filhos não estarem na escola e os pais serem os únicos responsáveis pela gestão do dia a dia aumenta a tensão familiar”.
Esta situação agrava-se quando há uma distribuição desigual das tarefas domésticas e parentais, algo que tende a ser tolerado no dia a dia, mas que, nas férias, se torna mais visível e causa conflitos. “Se as tarefas reprodutivas não tiverem uma distribuição equitativa, a tensão cresce”, afirma a terapeuta.
Expectativas irreais quanto ao potencial “reparador” das férias
Muitas pessoas adiam a resolução de problemas conjugais na esperança de que as férias sirvam como um momento de reconciliação e de cura para a relação. Contudo, essa expectativa é frequentemente defraudada. “Há a ideia de que, nas férias, com mais tempo para conversar, os problemas se resolvem”, aponta a psicóloga. Porém, não são raros os casos em que o diálogo, por si só, não é suficiente para ultrapassar certas questões profundas que afetam o casal.
Este contraste entre a idealização das férias e a realidade vivida pode ser doloroso, levando a uma sensação de urgência em tomar decisões drásticas, como separações ou divórcios.
A “rentrée” e a vontade de mudança
A reentrada no quotidiano após as férias – o que em francês se denomina de rentrée – traz consigo um sentimento de renovação e de desejo de mudança. Segundo Luana Cunha Ferreira, este período pode motivar as pessoas a reavaliar as suas vidas e relações, questionando se a forma como vivem está alinhada com aquilo que desejam. “A rentrée pode despertar a vontade de ser mais autêntico e de executar planos com que sonharam”, refere.
Neste contexto, as separações ou o divórcio surgem como mudanças radicais, que embora difíceis, podem ser vistas como passos necessários para um recomeço. “O divórcio é uma mudança incrível, muitas vezes muito positiva”, reconhece a psicóloga, ainda que sublinhe que o processo em si pode ser traumático.
As férias não são uma sentença de fim para todos os casais
É importante salientar que, embora as férias sejam um momento de crise para alguns casais, para outros representam uma oportunidade de renovação e reconexão. Quando o stress do dia a dia – seja o excesso de trabalho, a precariedade laboral ou as exigências da parentalidade – é temporariamente aliviado, as férias podem permitir ao casal fortalecer os seus laços e reinventar a relação.
Luana Cunha Ferreira sublinha que “se o casal tiver bons mecanismos de comunicação e de adaptação, as férias podem ser um momento de criação de novas bases para a relação”, contribuindo para uma rentrée mais equilibrada.
Como evitar que as férias se tornem um momento de separações?
Para evitar que as férias sejam um catalisador de crise, a psicóloga sugere que os casais invistam regularmente na sua “saúde relacional”, da mesma forma que cuidam da saúde física e mental. “Tal como vamos ao ginásio ou fazemos uma corrida três vezes por semana, também o casal deve ter momentos regulares para fazer pontos de situação e para se conectar”, aconselha.
Assim, em vez de se “sentarem confortavelmente” na relação, Luana Cunha Ferreira recorda que as relações são dinâmicas e requerem atenção constante, sob pena de o “sofá confortável” se transformar numa fonte de instabilidade.
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