A Iniciativa Liberal vai apresentar um projeto de revisão constitucional com uma primeira parte dedicada a retirar “carga ideológica à Constituição”, clarificando, por exemplo, que serviços públicos de saúde e educação podem ser prestados pelo privado e social.
Em declarações à agência Lusa, o deputado único da Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo, explicou que, aberto o processo de revisão constitucional pelo Chega, o partido decidiu apresentar “medidas cirúrgicas, concretas e pontuais”.
Apesar de preferirem uma “revisão muito mais estruturada e muito mais profunda”, os liberais não queriam ficar fora de processo, já que no Programa Político do partido a primeira proposta é precisamente a revisão da Constituição da República Portuguesa.
“Vamos apresentar três conjuntos de medidas, cada um deles dedicados a uma parte da Constituição”, explicou, ficando assim de fora das propostas dos liberais a parte IV, relativa à garantia e revisão da Constituição.
De acordo com João Cotrim Figueiredo, as primeiras propostas dizem respeito ao preâmbulo e à parte I, sendo o objetivo retirar “carga ideológica à Constituição” e permitir que “o atual quadro político possa funcionar como está ou possa vir a ser alterado no futuro por escolha dos portugueses”.
Do preâmbulo, os liberais querem retirar a expressão “abrir caminho para uma sociedade socialista”, considerando o deputado que “já não faz sentido nenhum e que limita as escolhas dos portugueses nas suas opções políticas”.
A Iniciativa Liberal pretende ainda que seja clarificado que o direito à saúde e à educação pode ser prestado “pelos setores privado e social, garantindo liberdade de escolha aos cidadãos”, defendendo também o “fim da obrigatoriedade de um serviço público de rádio e de televisão”.
“Nenhuma das obrigatoriedades de serviço público que estamos a querer rever significa o fim dos serviços públicos, significa apenas o fim de que eles sejam obrigatoriamente prestados pelo Estado. Os serviços públicos são importantes e a Iniciativa Liberal nunca propôs o fim do estado social ou sequer a sua redução significativa”, explicou.
No artigo relativo ao direito à greve e proibição do lock-out, os liberais pretendem introduzir um ponto que determina que “o exercício do direito à greve não pode impedir o direito ao trabalho daqueles que o pretendam exercer”.
Já no âmbito dos direitos dos trabalhadores, a Iniciativa Liberal quer que seja introduzida a possibilidade de o salário mínimo ser municipal.
“O estabelecimento e a atualização do salário mínimo nacional ou municipal, nos termos da lei, tendo em conta, entre outros fatores, as necessidades dos trabalhadores, o custo de vida, o nível de produtividade e as exigências da estabilidade económica e financeira”, propõe.
O processo de revisão constitucional, aberto pelo Chega, poderá “morrer” em poucos meses se os dois maiores partidos, PS e PSD, se entenderem para “chumbar” todas as propostas do deputado André Ventura.
Fontes da direção dos grupos parlamentares do PS e do PSD, partidos de quem depende a revisão da Constituição, por exigir o voto de dois terços dos deputados, admitiram à Lusa em 09 de outubro que o processo se abra, mas feche em pouco tempo, como aconteceu em 2014, com todas as propostas chumbadas.
Questionado sobre esta possibilidade, João Cotrim Figueiredo foi perentório: “não sabemos de facto se o processo irá até ao fim ou sequer se vai começar com grande conteúdo, mas não poderemos estar fora dele”.
Após o despacho de Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República, de aceitar o projeto do Chega, em novembro é formada uma comissão eventual de revisão constitucional, cumprindo-se o prazo para os restantes partidos ou deputados apresentarem as suas propostas.