Há poucos anos, lamentava-se um amigo de Aveiro que o cabeleireiro onde costuma ir cortar o cabelo não passava factura para fugir aos impostos enquanto ele cumpria todas as suas obrigações fiscais atempadamente. Retorqui-lhe que o problema não está nos ‘pequeninos’ fugirem aos impostos mas está nos ‘donos disto tudo’ que roubam e dão a roubar os impostos que os ‘pequeninos’ pagam, eles são insaciáveis, não pagam o que deviam pagar e ainda vão buscar meios financeiros pagos pelos cidadãos honestos através de isenções fiscais, subsídios, negócios fraudulentos para o Estado, subterfúgios contabilísticos apresentando prejuízos quando têm lucros, ordenados e pensões que eles próprios têm vergonha que o Povo saiba, rendimentos e negócios escuros em offshores, para além da corrupção e da organização económica e judicial feita à medida dos seus interesses.
Disse àquele amigo que eu próprio não peço factura no comércio tradicional e aos pequenos prestadores de serviços e aconselho todos os amigos a fazerem o mesmo. Se não formos nós a ajudarmo-nos uns aos outros, quem é que nos ajuda? Não sou agente do Estado para andar a fiscalizar e denunciar ou exigir aos pobres que paguem todos os impostos para logo a seguir esse dinheiro ser desbaratado por quem tem o Poder e arrecadado por quem tudo tem, mas quem está no ‘xadrez’ é o Senhor Rui Pinto que trouxe à luz do dia uma pequena parte do iceberg de vigaristas. O argumento de que se todos pagarmos os impostos cada um de nós paga menos, apesar de ser verdadeiro, no contexto actual de incompetência e de injustiça fiscal, torna-se falacioso.
Não posso dizer para ninguém pagar impostos porque seria acusado de incentivo à evasão fiscal, mas às vezes sinto essa vontade. Isto é, “somos todos iguais, mas há uns mais iguais do que outros” (filme ‘o triunfo dos porcos’).
Temos a obrigação de contribuir com algum do nosso esforço quotidiano para a sociedade para podermos exigir aos gestores da coisa pública a distribuição equitativa de benefícios e segundo as necessidades especificas de cada cidadão. Em sociedade temos deveres e direitos, para estes poderem ser exigidos por nós devemos primeiro cumprir os nossos deveres. O Estado somos nós e os bens do Estado são os bens que colocamos à sua disposição, não devem ser sonegados e delapidados oportunisticamente por quem ocupa transitoriamente os cargos do Poder ou outros que se servem deles.
Uma coisa é a teoria económica e a teoria política, outra coisa é a realidade concreta do sistema capitalista deturpado nos seus princípios éticos. Por um lado, a teoria económica demonstra-nos que é necessário que todos os cidadãos cumpram os seus deveres para com a sociedade para que o bem comum possa ser cumprido, por outro lado a teoria política indica-nos o caminho da igualdade entre cidadãos. Contudo, a ganância, o egoísmo, a inveja e a maldade deturpam os princípios fundamentais da convivência cívica em sociedade.
Certamente que continuarei a dizer aos amigos todas as minhas opiniões acerca da fuga ao fisco.