A chuva que caiu esta semana no Algarve está longe de resolver o problema da falta de água na região. As barragens apresentam níveis inferiores a metade da sua capacidade. Perante a repetição cíclica de anos de seca prolongada, os responsáveis da Águas do Algarve, em articulação com outros organismos regionais, têm em execução um conjunto de ações para responder a situações de emergência e planos de médio prazo com respostas estruturais para enfrentar o problema. O POSTAL pediu ao presidente da Águas do Algarve, Joaquim Peres, para fazer o ponto de situação.
Entrevista de Ramiro Santos – Jornalista
P – Qual é a atual situação de reserva de água para abastecimento público existente nas barragens do Algarve?
R – Os volumes de água superficial acumulados nesta data são os seguintes: Odelouca – 47 hm3; Odeleite – 34 hm3; Beliche – 12 hm3. Poderemos ainda considerar a água existente nas albufeiras da Bravura e do Funcho. Há ainda as reservas existentes nos aquíferos da região.
P – Como classifica a situação: dramática, preocupante, normal?
R – Preocupante.
P – Se não chover no próximo inverno, para quanto tempo chegarão as reservas existentes?
R – O consumo humano anual é de aproximadamente 73 hm3.
P – Numa previsão de não ocorrência de chuva em quantidade nos próximos meses, é admissível recorrer ao racionamento no consumo doméstico de água?
R – Creio que o termo “racionamento” não será o mais indicado. Deveremos todos ter consciência da necessidade de uma utilização regrada do bem que nos é disponibilizado nas nossas torneiras.
P – Qual a capacidade de resposta da Águas do Algarve para fazer face a uma emergência?
R – A capacidade existente não é inesgotável mas existem medidas que, fazendo parte do nosso plano estratégico, permitem possibilitar alguma resposta.
P – Há algum plano para um cenário desta natureza em articulação com as autarquias e a Proteção Civil? E com Espanha, considerando a necessidade de garantir os caudais do Guadiana?
R – APA e a DGADR coordenaram a elaboração do “Plano de Eficiência Hídrica para o Algarve”, que contou com a colaboração ativa de todos os setores da vida da região, de forma a poder dar as respostas necessárias face aos vários cenários que foram aparecendo na região.
P – O recurso às águas subterrâneas, utilizando os furos artesianos municipais e particulares, é uma possibilidade ou os níveis freáticos não garantem a alternativa?
R – A água recolhida no subsolo deve ser considerada uma reserva estratégica para uma utilização de reserva, se outra fonte não existir. Mas temos que ter muito cuidado com essa utilização. A exploração excessiva dessa origem pode permitir a entrada de água salobra nos aquíferos e, dessa forma, tornar muito difícil a sua utilização. Há alguns anos, antes da existência da Águas do Algarve, muitos se lembram de abrir a torneira e, ou não jorrar água ou, aquela que saía, não se conseguir beber.
P – Perante este quadro de seca prolongada e acumulada com tendência a agravar-se no futuro, a Águas do Algarve tem algum plano estrutural a médio e longo prazo para assegurar o abastecimento público, a nível da política de transvases e de construção de novas barragens? E o recurso à dessalinização está a ser considerado?
R – A empresa Águas do Algarve ajudou a traçar um plano estratégico para a região, tal como já referido, onde estão previstas várias medidas de curto, médio e longo prazo. Pelo lado da procura, devem todos os utilizadores fazer um esforço grande para evitar consumos exagerados. Deve ser criada a consciência sobre a poupança de uso da água. Devem também ser feitos esforços no sentido de serem evitadas perdas desse bem fundamental.
Do lado da oferta, estão incluídas, no Plano de Eficiência Hídrica para o Algarve, um conjunto de medidas importantes para dar resposta à carência verificada. Algumas medidas já estão em marcha. Na ETA de Alcantarilha está em fase de conclusão até ao final de 2020, a construção de uma unidade de flotação que vai permitir tratar um maior volume de água do que atualmente existe. Com esta medida poderemos ter condições mais favoráveis de gerir a água existente na zona de Sotavento e na zona de Barlavento.
Está em elaboração o estudo de reforço da capacidade de transporte de água entre essas duas zonas. Estamos em condições de avançar com a recolha do volume morto da albufeira de Odeleite.
A albufeira do Funcho pode ser um reforço de abastecimento de água para consumo humano. Este ano já forneceu cerca de 12 hm3.
Temos o projeto pronto para se iniciar a obra de construção de uma estação elevatória, a criar na ETAR de Vila Real de Santo António, para reutilizar água na rega de dois campos de golfe e em dois pomares. Estamos desenvolvendo estudos para a concretização da instalação de uma dessalinizadora na região. Estão sendo feitos os contactos necessários para viabilizar a recolha de água no Rio Guadiana para a colocar na barragem de Odeleite. Temos estudos para aumentar a capacidade de retenção de água na albufeira de Odelouca.
P – Faz sentido que, face a este problema de falta de água para consumo, se continue a utilizar a água da rede pública ou de furos, na rega dos campos de golfe ou para a agricultura, havendo, por exemplo, a possibilidade de utilização de águas tratadas das ETARs?
R – A água, sendo um elemento escasso e fundamental para a vida, deve ser utilizada com muita inteligência. A água que sai das ETARs, devidamente tratada, pode constituir uma nova fonte de oferta para ser utilizada com as finalidades referidas.
Medidas em curso
► Na ETA de Alcantarilha está em fase de conclusão, até ao final de 2020, a construção de uma unidade de flotação que vai permitir tratar um maior volume de água do que atualmente existe. Com esta medida haverá condições mais favoráveis de gerir a água existente na zona de Sotavento e na zona de Barlavento.
► Vai avançar a recolha do volume morto da albufeira de Odeleite.
► A albufeira do Funcho pode ser um reforço de abastecimento de água para consumo humano. Este ano já forneceu cerca de 12 hm3.
► Temos o projeto pronto para se iniciar a obra de construção de uma estação elevatória, a criar na ETAR de Vila Real de Santo António, para reutilizar água na rega de dois campos de golfe e em dois pomares.
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