Nas margens da Ria Formosa, numa quinta em Arroio, Luz de Tavira, em área classificada como Parque Natural, sítio da Rede Natura 2000, Reserva Ecológica Nacional e protegida pelo plano de Ordenamento da Orla Costeira, foi erguida uma infraestrutura temporária para festas sem a autorização devida de todas as entidades competentes.
A festa aconteceu entre a tarde desta quinta-feira e as 4h00 da manhã de sexta, com música a ouvir-se a mais de 500 metros de distância. Neste caso, a razão foi a boda de Joana Lemos (condutora portuguesa de ralis) com o milionário italiano Lapo Elkann (neto de Gianni Agnelli e um dos herdeiros do império que envolve a Juventus e a Ferrari). A empresa organizadora do evento não terá tratado das autorizações devidas atempadamente e pode incorrer em processos de contraordenação e multa.
Segundo o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), o pedido de parecer para a “colocação de duas tendas na propriedade privada dentro do Parque Natural da Ria Formosa, para a realização de uma cerimónia de casamento prevista para esse mesmo dia”, só lhes chegou por email “às 13h16 do dia 7 de outubro”. Informavam que no mesmo dia tinham feito um “pedido de licença especial de ruído ao Município de Tavira” e “ realizado um plano de medidas de autoproteção e evacuação de emergência, que contemplam a presença das autoridades locais imprescindíveis”. De acordo com o ICNF, “foi realizada uma visita ao local por uma equipa de vigilantes da natureza, que verificou que as tendas se localizam no logradouro e jardim da propriedade e não afetam valores naturais”. Contudo, como o pedido não foi feito atempadamente, como dita o plano de ordenamento do Parque Natural da Ria Formosa, a organização do evento “incorre numa contraordenação”.
A presidente da Câmara de Tavira, Ana Paula Martins, confirma ao Expresso que a autarquia recebeu “um único pedido de licença de ruído e apenas para uma noite”, ao qual deram “parecer positivo”. Segundo a autarca, “o pedido referia que se tratava de uma festa, um casamento, numa propriedade privada, e não tinha qualquer referência à montagem de uma tenda, pelo que pensámos que seria no interior de uma casa particular”, E defende-se, argumentando que “não cabe à Câmara licenciar ou proibir festas em propriedades privadas”. Quanto aos contactos com o ICNF, diz que esta entidade enviou “um email na quinta-feira de manhã” para a autarquia para saber o que se passava relativamente à festa, e que responderam ter passado a dita licença de ruído. “Como se trata de uma área de jurisdição do ICNF, sugerimos que fizessem uma inspeção no local com a GNR”, informa Ana Paula Martins.
Já a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve teve conhecimento do evento na véspera através de uma participação feita por um cidadão, que tem uma casa na vizinhança e que assistiu à montagem das infraestruturas e aos ensaios de som noturnos na segunda-feira passada. O cidadão, João Menezes (ex-dirigente do ICNF), conhecedor das regras de ordenamento do território, também apresentou queixa na GNR, mas foi-lhe dito que “tinham ordens para nada fazer”. Contactadas outras fontes da autoridade policial, confirmam que estas eram as ordens.
Fonte da CCDR confirma a queixa e diz não ter dúvidas de que o evento naquele local “é completamente ilegal ao abrigo da legislação da REN; Rede Natura 2000 (SIC – ZPE da Ria Formosa); POOC Vilamoura-Vila Real de Santo António; e regulamento do Parque Natural da Ria Formosa”. Apesar do evento já ter acontecido, o facto desta autoridade não ter sido consultada oficialmente pode levar à abertura de uma contraordenação e à aplicação de multa.
O Expresso sabe que, pelo menos até quinta-feira à noite, o ICNF não tinha contactado a GNR para fazer qualquer inspeção no local. E que, além de contradições nos tempos referidos pelo ICNF e a Câmara, nem GNR nem ICNF foram vistoriar o local. Além de uma empresa de segurança, a organização contratou em permanência dois militares da Guarda para estarem no local, durante a festa, em serviço gratificado.
A quinta na zona da Luz de Tavira (freguesia a que pertence Arroio) chegou a estar à venda por 7,5 milhões de euros e terá sido comprada recentemente por Lapo Elkann. Insere-se numa das zonas do Algarve junto à costa com menos pressão imobiliária.
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