E porquê esta necessidade de se alimentarem de animais, perguntará o leitor? A explicação é simples: estas plantas vivem em solos muito pobres e meios aquáticos (zonas pantanosas e turfeiras) que contêm muito pouco, ou mesmo nenhum azoto, um nutriente essencial, pois através dele as plantas sintetizam a clorofila. Alimentando-se de animais, estes facultam-lhes o azoto, permitindo a realização da fotossíntese e o seu consequente crescimento.
O carnivorismo nestas plantas é considerado uma adaptação nutricional, que foi evoluindo ao longo de milhares de anos, para permitir a sua sobrevivência. Para atraírem as suas presas, as plantas carnívoras, como por exemplo as ascídias, uma família de vinhas trepadoras dos trópicos, adota a forma de vaso ou bilha, com largura suficiente para capturar um rato!
E como os atraem? Libertam odores agradáveis, e os animais, na ilusão de que as folhas altamente especializadas são flores, são atraídos pelo falso néctar. Então, entram numa espécie de “alçapão” – a verdadeira armadilha que está geralmente coberta por mucilagem, uma espécie de cola que os retém – e onde são digeridos os pequenos mamíferos ou répteis, mas essencialmente os insetos. Uma vez sobre a flor, as presas são puxadas para baixo, deparando-se-lhes as espinhas aguçadas que impedem a fuga. A planta segrega um ácido e as enzimas digestivas que vão digerir a presa. O vaso que distingue esta flor serve de engodo para apanhar insetos voadores e ao mesmo tempo de sombreiro, para evitar que a água entre.
Nalgumas espécies, é o contrário, enchem-se com água da chuva, depois dos insetos entrarem, afogando assim a sua presa, em vez de a matar com o ácido. Em termos mecânicos, a mais sofisticada de todas as armadilhas é a da utriculária, que pertence a um género com uma distribuição alargada e que inclui o maior número de espécies: cerca de trezentas.
Em Portugal podem encontrar-se três dessas espécies (Utricularia subulata, U. gibbae U. australis). São plantas aquáticas que, consoante o respetivo tamanho, se alimentam seja do que for, desde protozoários unicelulares até pequenos peixes. Entre as folhas dos seus ramos subaquáticos crescem pequenas borbulhas, cada uma das quais com entrada para o alçapão que se abre para dentro. Na “porta da entrada” encontram-se os pêlos, e qualquer criatura que toque neles, faz o alçapão abrir-se. À medida que a água enche a borbulha, suga o animal. A borbulha, então, recorre a glândulas especiais para se fechar de novo, capturando a presa. Atualmente, as plantas carnívoras distribuem-se pelos cinco continentes.
A Austrália é o local onde há maior variedade de espécies, acolhendo cerca de um terço de todas as conhecidas. Em Portugal estão referenciadas na literatura oito espécies de plantas carnívoras espontâneas, pertencentes a duas famílias (Droseraceaee Lentibulariaceae).
Texto escrito por Ivone Fachada no âmbito do projeto Ciência@Bragança e agora disponibilizado para o projeto “Cultura, Ciência e Tecnologia” da Associação Portuguesa de Imprensa.
Ivone Fachada: Tem pós-graduação em História da Ciência e Educação em Ciências pela Universidade de Aveiro e Universidade de Coimbra (frequência de um doutoramento interdisciplinar). Mestre em Gestão e Conservação da Natureza pela Universidade dos Açores. Licenciada em Engenharia Florestal pelo Instituto Politécnico de Bragança. Membro da ScicomPt – National Science Communicators Network, fazendo parte da Direcção desta Associação entre outubro de 2017 e maio de 2020. Formadora de professores, credenciada pelo Conselho Científico e Pedagógico de Educação Continuada nos domínios: “A64- Ciências Ambientais” e “D08 – Educação Ambiental”. Autor ou co-autor de mais de trinta artigos em jornais, conferências e capítulos de livros.