As fotografias foram tiradas em Faro, mas poderiam tê-lo sido em Portimão, em Loulé ou em qualquer uma das mais de quarenta cidades que no país, de norte a sul e nas ilhas, bem como, no estrangeiro aderiram à manifestação convocada pelo movimento “Que se lixe a troika”.
Milhares, muitos milhares de algarvios, saíram à rua para dar nota de um Algarve empobrecido, em muitos casos moribundo economica e financeiramente e deram voz ao descontentamento que invade transversalmente a sociedade e graça aqui como por todo o país.
O desemprego, a precariedade, o desinvestimento público na economia como salvaguarda da força de trabalho portuguesa, especialmente a mais nova e qualificada que se vê, em muitos casos, obrigada a deixar o país percorreram as conversas dos manifestante durante o percurso que teve como local de concentração o Largo do Carmo.
Lado-a-lado os jovens e os muito jovens, os trabalhadores e os desempregados, os reformados e os pensionistas foram engrossando um cortejo que as forças policias no local cifravam a dado momento na ordem das “cinco mil pessoas”. Um número que a organização diz, terá sido largamente superado quando comparado com a mesma cifra atribuída pelas autoridades à manifestação dos “indignados” de Setembro de 2012.
Indiferente é o número, inegavelmente esmagador quando feito o cômputo da manifestação em termos nacionais. A Grândola Vila Morena ouvida a cinco mil vozes em Faro ou em Portimão pesa o mesmo que a Grândola Vila Morena a plenos pulmões ecoada no Terreiro do Paço pela voz de centenas e centenas de milhares.
É a canção feita hino de um povo que espera e desespera e em muitos casos já se resigna e se abandona perante uma crise sem fim. Perante um Governo que de falha em falha nas previsões e nos resultados, caminha trôpego em promessas feitas nascer entre o Terreiro do Paço e a tríade do Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional.
A voz da rua em protesto
“Não aguentamos mais. O povo tem de fazer alguma coisa para travar este Governo”, disse à Lusa Maria do Rosário, de 52 anos, escriturária desempregada, residente em Faro.
A situação económica, com duas filhas menores a seu cargo, foi o que a impulsionou a sair à rua e a protestar contra o que chama de “miséria colectiva”.
“Desde há um ano que tenho vivido de esmolas dos vizinhos para conseguir sustentar as minhas filhas”, sublinhou, emocionada, ao recordar a sua situação económica, acrescentando que “já não tem esperança alguma neste Governo”.
Ao seu lado, Gertrudes Morais, de 54 anos, empregada doméstica, e residente em Faro, também participou no protesto, “face à situação dos dois filhos desempregados”.
“Estou aqui por eles e pelos meus netos. Já não sabemos o que fazer com o desemprego. Há muita injustiça. Isto é horrível”, afirmou.
Por seu turno, Anabela Quintas, de 26 anos, desempregada, também a residir em Faro, justifica a sua participação na manifestação com a “injustiça que o povo está a passar”.
“Há mais de um ano que procuro emprego diariamente e não há. Os impostos aumentam, o custo de vida, e o pouco que recebo de subsídio de desemprego não chega para comer”, destacou à Lusa, durante o protesto.
Exemplos de um mar de descontentamento que graça na região de barlavento a sotavento e que se espalha num país cujo povo e respectivas expectativas e anseios se vêem soçobrar perante o peso da crise sem fim à vista.
Para estes manifestantes as “vitórias” do Governo nos mercados da dívida e os potenciais alívios à austeridade na calha de uma Europa que decide tarde e lenta são alentos sem relevo no confronto diário com um mercado de trabalho sem colocações e com uma carteira vazia ou semeada de ‘tostões’.
À espera das decisões
A manifestação de 2 de Março decorreu em plena visita da ‘troika’ a Portugal no âmbito da sétima avaliação ao programa de ajustamento que a par da Irlanda e da Grácia se aplica ao país.
Ainda sem decisões definitivas relativas a esta sétima ronda de controlo das contas portuguesas, resta saber em que novos termos será determinado o cumprimento do memorando de entendimento e se mesmo estes, supostamente mais vantajosos, serão suficientes para dar folga ao bolso dos portugueses e a folga necessária à economia do país e ao seu crescimento.