Até 30 de setembro, uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa desafia os cidadãos a estarem atentos aos sons das cigarras: ao gravar o som do seu canto com o seu telemóvel, registar a localização GPS e partilhar estes dados com os investigadores, ajuda-os a criar um mapa atualizado da distribuição geográfica das 13 espécies de cigarras que existem em Portugal.
As cigarras são insetos conhecidos pelo seu canto característico no verão. Na verdade, apenas os machos de cigarra cantam, para atrair as fêmeas para o acasalamento durante as poucas semanas de vida que lhes restam enquanto adultos – pois as cigarras passam vários anos no solo a desenvolver-se – e o seu canto é específico de cada espécie, o que permite identificar mais facilmente as espécies que existem numa região.
Em Portugal existem 13 espécies de cigarras – apenas em território continental, não existem cigarras nos Açores e na Madeira – mas pouco se sabe sobre a sua distribuição geográfica atual no nosso país. É com esse objetivo que surge o projeto Cigarras de Portugal – Insetos Cantores, que desafia os cidadãos a estarem atentos ao canto destas espécies, no seu dia-a-dia ou em férias em Portugal.
“O último censo das cigarras de Portugal, que confirmou a presença de 13 espécies no nosso país, decorreu já em 2004 – e algumas destas espécies são extremamente raras. Assim, pretendemos com este projeto envolver os cidadãos na monitorização das populações de cigarras em Portugal e, através destes registos, avaliar a vulnerabilidade destas espécies ao risco de extinção”, explica Paula Simões, responsável pelo projeto e investigadora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
Uma das espécies que preocupa os investigadores é o cegarregão (Lyristes plebejus). É a maior espécie de cigarra existente em Portugal – tem cerca de 5cm de comprimento e o seu canto faz lembrar o ruído de uma panela de pressão (pode ver-se e ouvir-se aqui) – e é uma das espécies que se encontra em acentuado declínio: outrora abundante na região centro do país, agora é raro ouvir-se o canto do cegarregão.
“O declínio do cegarregão pode estar relacionado com a perda de habitat causada pela desflorestação, pela urbanização e pela agricultura intensiva. Mas outras espécies de cigarras continuam abundantes na zona centro, o que nos faz suspeitar que outros fatores podem estar também a contribuir para o declínio do cegarregão. Será esta espécie mais sensível ao aumento da temperatura média que se tem vindo a verificar nas últimas décadas? Para a maioria das espécies de cigarras quanto mais quente melhor, mas o cegarregão não ocorre no sul de Portugal e de Espanha, por exemplo, onde as temperaturas médias são mais elevadas no nosso país”, explica Vera Nunes, uma das investigadoras do projeto e investigadora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
É para responder a esta e outras perguntas que o projeto Cigarras de Portugal – Insetos Cantores está em marcha. Todos podem contribuir: basta que, ao ouvir o canto de cigarras, grave o som com o seu telemóvel, registe a data e a localização geográfica – se possível com as coordenadas GPS – e submeta estes dados na página Facebook do projeto ou na plataforma Biodiversity4All. Os dados recolhidos vão ajudar os investigadores a recolher informações mais precisas sobre as áreas de distribuição das 13 espécies de cigarras existentes em Portugal.
“As cigarras tendem a agrupar-se em pequenos núcleos, o que explica que no mesmo pinhal possamos ouvir cigarras num ponto e não as ouvir 500m mais à frente. No caso das espécies mais raras é preciso estar no local certo e à hora certa para as detetar, o que por vezes se assemelha a procurar uma agulha num palheiro. É por isso que o contributo de todos é muito importante!”, conclui Paula Simões.
O projeto Cigarras de Portugal – Insetos Cantores surge no âmbito da criação da primeira Lista Vermelha de Invertebrados de Portugal, atualmente em curso.
Gabinete de Comunicação do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais
(2019 – Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva)
(CM)