De acordo às estimativas da UNICEF relativamente à crise migratória de refugiados e migrantes, entre janeiro e agosto de 2020, cerca de 50.000 refugiados chegaram à Europa, sendo que 10.000 eram crianças desacompanhadas. A tendência para este ano é que os refugiados continuem a chegar, e o lamentável exemplo disso foi a recente situação em Ceuta.
Tendo desfrutado do privilégio de não me ter sido roubada a infância, quando oiço o termo “criança” lembro-me de feiras populares e algodão doce, do Natal em família e, das festas de aniversário com os amigos da escola. Não consigo imaginar o que aconteceria comigo se tivesse sido separada do meu seio doméstico desde cedo, não recebendo os cuidados provenientes de uma base familiar, sendo obrigada a sobreviver sozinha noutro país, em tão tenra idade, podendo passar anos em centros de acolhimento. No entanto, a violência emocional a que os jovens e crianças refugiadas estão submetidas, é a imagem da sua infância que ficará tatuada nas suas vidas, simplesmente por terem sido obrigados a cortar o seu cordão umbilical, para serem literalmente salvos.
Quando era adolescente, vi nos telejornais a imagem de um menino de calções vermelhos e camisola azul, estendido, sem vida, numa praia. Este menino chamava-se Alan Kurdi e tinha morrido numa travessia ilegal, juntamente com a sua família, a tentar pisar o solo do continente europeu. Naquela altura eu não conseguia entender a razão da sua morte. Hoje, com 20 anos, lembro-me vezes sem conta desta imagem chocante, que se juntam a muitas outras que infelizmente se vão tornando comuns no nosso dia-a-dia e não causando a mesma indignação que a imagem de Alan, vindo a tornar-se o símbolo da crise migratória da Europa, em 2015. Passados 6 anos, volta a aterrorizar-me uma imagem semelhante, mas desta vez a do resgate de um bebé com apenas meses, em Ceuta, no mar de Alborão, a nova rota de imigrantes, entre o Norte de África e a União Europeia.
Nunca um número tão grande atravessou as fronteiras espanholas, atingindo o total de 8.000 migrantes. Nestes, 1500 eram crianças, sendo que centenas estão no limbo presas dentro e fora de Espanha. Há que lembrar que o perigo de cada travessia ilegal é um risco que só realmente uma pessoa em desespero corre e, não obstante a fragilidade da vida de cada refugiado, é desumano que as suas necessidades sejam utilizadas como arma de arremesso face a um conflito político. Cada uma destas crianças e jovens refugiados, uma vez postas em solo Espanhol, deve ser protegida e não mantida em armazéns, aglomerada e submetida a condições sub-humanas. O mínimo que se esperava do continente Europeu era o respeito à vida de todas elas, o respeito pela dignidade da pessoa humana, o respeito pelos valores da União, o respeito pelas Convenções internacionais e, por último, mas não menos importante o respeito pela Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia.
Neste mês de maio, onde se comemora o dia da mãe em domingos diferentes pelos quatro cantos da Europa, invocamos o amor de mãe e recorremos à mãe Europa para que o continente Europeu não seja transformado num carimbo de retorno, retirando a oportunidade de uma vida melhor a cada um dos refugiados. Pedimos à mãe Europa que seja para estes um lar, e não apenas um colchão num campo de refugiados, que parece ser o triste destino daqueles que conseguem aqui permanecer.