O cancro é mais mortal quando as células de um tumor entram na corrente sanguínea e se deslocam para um novo local no corpo para se alojar: o processo denominado metástase. Um estudo publicado nesta quarta-feira na revista científica Nature concluiu que, para pessoas com cancro da mama, estas células nocivas – intituladas células tumorais circulantes – são mais suscetíveis de passar para o sangue à noite do que durante o dia.
A investigação mostra que “os tumores acordam quando os pacientes estão a dormir”, de acordo com Nicola Aceto, biólogo oncológico do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique e um dos autores do estudo. É um “passo em frente” na compreensão da metástase. “E os passos em frente são uma coisa boa para os pacientes a longo prazo.”
A equipa começou por reparar que os níveis de células tumorais circulantes em ratos variavam dependendo da hora do dia em que o sangue era recolhido. Essa observação levou a que fizessem a recolha de sangue de 30 doentes com cancro da mama uma vez às quatro da manhã e outra às dez da manhã.
Quase 80% das células tumorais circulantes encontradas nas amostras de sangue apareceram na recolha efetuada às quatro da manhã, quando os doentes ainda estavam em repouso. “Fiquei surpreendido porque o dogma é que os tumores enviam células em circulação a toda a hora. Mas os dados eram muito claros. Tão pouco tempo depois de sermos surpreendidos, começámos a ficar muito entusiasmados”, conta Aceto.
Para confirmar a aparente descoberta, além da amostra realizada, foram introduzidos tumores do cancro da mama em ratos. O grupo descobriu que os níveis de células tumorais circulantes atingiram o pico durante o dia, quando os ratos estavam no seu estado de repouso – estes animais são mais ativos durante a noite e tendem a descansar durante o dia.
Além disso, também recolheram as células tumorais circulantes enquanto os ratos estavam tanto em repouso como ativos e injetaram-nas novamente, o que permitiu descobrir que a maioria das células que se transformaram em novos tumores foram as recolhidas quando os ratos estavam em repouso.
Esta revelação é “impressionante”, classificou o biólogo oncológico Chi Van Dang, do Ludwig Cancer Research, à Nature. Os níveis de células tumorais circulantes no sangue são medidos no diagnóstico do progresso de um doente com cancro e esta novidade mostra que a “altura do dia em que se tira uma amostra de sangue pode dar informações enganosas”, aponta.
Quanto à razão pela qual as células do cancro da mama em humanos são mais ativas à noite, Aceto indica que tal deve-se provavelmente a uma multiplicidade de fatores que ainda precisam de ser investigados, mas as hormonas poderão desempenhar um papel relevante.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL