Com o processo de descentralização em curso, que implica a transferência de competências para os municípios, e num contexto de reforma do SNS, poderá fazer sentido “reservar as ARS para uma função que não a de prestação de cuidados”, afirmou Marta Temido.
Ouvida na Comissão de Saúde da Assembleia da República, na manhã desta quarta-feira, a ministra da Saúde assumiu, no futuro, “mais autonomia para os ACES e para os hospitais”, num processo “faseado e progressivo”, que abre a porta para uma menor alçada das ARS.
A discussão encrespada pelas recentes falhas nas urgências de obstetrícia de vários hospitais, por falta de médicos obstetras, levou a que os deputados dos diferentes partidos da oposição colocassem Marta Temido a responder perante os planos de curto prazo. A ministra lembrou que mais importante que isso, estão os problemas de fundo, para os quais uma das reformas a fazer é rever as redes de referenciação hospitalar, em contexto do PRR.
E respondendo ao que falhou, pergunta do deputado Ricardo Baptista Leite, do PSD, disse que “sabendo-se que havia momentos deste verão em que as urgências poderiam não ser asseguradas, poder-se-ia ter tomado a decisão do funcionamento articulado”, lança.
MAIS ESPECIALISTAS
O tratamento prescrito voltou a ser o mesmo: a ministra da Saúde, Marta Temido, afirma que é preciso formar mais ginecologistas-obstetras porque a média de 40 por ano – 46 a 48, segundo a Ordem dos Médicos – não chega para responder às necessidades do país.
Há, para esta especialidade, à volta de 1800 médicos especialistas, mas 35% têm mais de 65 anos, o que leva Marta Temido a afirmar que “mesmo que conseguíssemos captar para o SNS todos os médicos especialistas em obstetrícia no país, continuaríamos com alguns problemas”.
Na manhã desta terça-feira, na Comissão Parlamentar de Saúde, Temido não disse, também uma vez mais, como vai atrair os especialistas para as vagas no Serviço Nacional de Saúde (SNS), exigência dos sindicatos.
Aos deputados, a governante sublinhou que são agora mais 103 obstetras e 200 enfermeiros especialistas na área, contudo, um reforço aquém das necessidades para os 38 pontos do SNS com bloco de partos. “Precisamos de reforçar este número e rever o acesso à formação para garantir que o país tem a resposta que precisa e para que no futuro outra equipa no Ministério da Saúde não tenha de voltar a discutir os mesmos problemas.”
Mas, para os sindicatos, há um erro de diagnóstico: se a rede pública não oferecer melhores condições, os novos especialistas, sejam quantos forem, não vão optar por trabalhar no SNS. E sobre isto, a ministra foi omissa, apenas voltando a referir que acredita que o regime de dedicação plena será a solução. Novamente, esse regime não agrada aos médicos precisamente pela falta de condições de trabalho e não apenas remuneratórias.
Aos deputados, a ministra da Saúde adiantou que o regime de dedicação plena de médicos estará pronto para vigorar daqui a três anos, quando o Governo estima que esteja ultrapassada a situação médica adversa.
CASCAIS COM GESTÃO PRIVADA ATÉ 2031
A ministra da Saúde adiantou ainda no Parlamento que o concurso para a gestão privada do Hospital de Cascais está a decorrer e que em janeiro de 2023 estará ativo. Será para oito anos e tem um valor global máximo de 561 milhões de euros. Até lá, mantém-se o Grupo Lusíadas Saúde, que aceitou prorrogar a gestão, por um ano, até ao término do atual concurso. Marta Temido explicou que o recurso às parcerias público-privadas na Saúde será sempre residual e um recurso somente necessário na falta de alternativas.
MÉDICOS DE FAMÍLIA “CONTINUAM A PRIMEIRA PRIORIDADE”
As reformas previstas para o SNS, algumas em contexto de Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), não tirarão dos objetivos do governo aquele que é o principal problema detetado, a falta de médicos de família para mais de um milhão de pessoas em Portugal. Por isso, Marta Temido lembrou o despacho aprovado esta terça-feira que garante um incremento de 60% de vencimento para médicos de família que ocupem vagas em zonas carenciadas. Essa continua a ser a “primeira prioridade”.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL