As urnas fecharam em todo o território brasileiro e as primeiras projecções dão vitória a Bolsonaro.
Ainda não é oficial, mas Jair Bolsonaro é apontado como o grande vencedor da primeira volta das eleições presidenciais no Brasil. [Ler artigo de Helder C. Martins no Expresso].
31 detidos, 964 urnas com defeito e pistolas para votar
Já começou a contagem dos votos no Brasil e o mundo precisa de seguir esta noite. Bolsonaro é um dos nomes mais temidos por quem receia o regresso dos dias da ditadura – e é igualmente um dos favoritos desta noite.
Haverá segunda volta? O que espera o Brasil e o que é que o mundo deve saber?
Estamos em direto. As urnas fecham às 23h de Portugal (e as primeiras projeções começam a essa hora), mas há locais em que já encerraram. Há quem tenha votado armado – e fez gala disso. [Ler artigo de 21h03 ANA FRANÇA E HELDER C. MARTINS no Expresso].
Quem é Bolsonaro, o homem que vai ganhar a primeira volta das eleições no Brasil?
Conheça o perfil de Jair Bolsonaro, o candidato que lidera das sondagens. Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso de dia 11 de agosto de 2018, assinado por Helder C. Martins.
Desbocado, racista, homofóbico, adepto de uma intervenção militar, Jair Messias Bolsonaro é dado como favorito nas sondagens, com cerca de 20% das intenções voto, num provável cenário eleitoral que não contará com a participação de Lula da Silva.
Capitão na reserva, 63 anos de idade, Bolsonaro é deputado há 28, sem intervalo, e fez entrar o Brasil no clube de países com candidatos Presidenciais de extrema-direita — como aconteceu em França ou nos EUA. O militar na reserva apresenta-se pelo pequeno Partido Social-Liberal, o nono onde já militou, e que só tem sete deputados entre 531.
Num país mergulhado numa profunda crise económica, minado por sucessivos escândalos de corrupção, e onde 43% dos eleitores estão indecisos, o espaço para o imprevisto é grande — alertam analistas. A tónica de discurso “musculado” que o caracteriza põe em delírio os seus seguidores, conhecidos por “bolsominions” (uma referência aos lacaios dos desenhos animados). A menos de dois meses das eleições de 7 de outubro, são inevitáveis os paralelismos com Donald Trump que, contra todas as previsões, acabou por ser eleito. A violência da retórica de Bolsonaro ultrapassa a do Presidente dos EUA; o agora candidato a Presidente do Brasil é conhecido por defender a pena de morte, a ditadura militar, a liberalização do porte de arma e a esterilização dos pobres; e parte para esta corrida eleitoral com a maior taxa de rejeição — 76% dos brasileiros dizem que nunca votarão nele. Um indicador quase tão determinante quanto a taxa de aprovação num sistema eleitoral que tem duas voltas.
Há 19 anos (1999), dizia ao jornal “O Estado de S. Paulo” que admirava o então Presidente venezuelano Hugo Chávez: “É uma esperança para a América Latina, e gostaria muito que essa filosofia chegasse ao Brasil. Ele vai fazer o que os militares fizeram no Brasil em 1964, com muito mais força.”
APOLOGIA DA TORTURA E DA VIOLAÇÃO
Ao longo de 28 anos de atividade parlamentar, Bolsonaro só apresentou 176 propostas; destas, só duas chegaram a lei — uma, sobre a redução do imposto sobre eletrónica (1996), e outra sobre o uso da fosfoetanolamina sintética, conhecida como “pílula do cancro”, medicamento sem resultados comprovados que viria a ser suspenso pelo Supremo Tribunal. Em 2014, Bolsonaro foi eleito pelo estado do Rio de Janeiro; sob o tema da segurança — o homem que diz que “bandido bom é bandido morto”— não apresentou uma única proposta.
Apesar da sua medíocre prestação como deputado num Parlamento maioritariamente conservador, é conhecido no Congresso por vários processos e condenações. São os casos do elogio ao coronel Ustra, ex-comandante do DOI- CODI — polícia política do exército durante a ditadura brasileira —, que foi um dos torturadores da ex-Presidente Dilma Rousseff, ou da apologia da violação quando, há dois anos, se dirigiu à deputada do PT, Maria do Rosário, e lhe disse que não a “iria violar, porque não merece”.
Este ex-militar apresenta-se como um impoluto defensor da honestidade, apesar de ter sido eleito pelo Partido Progressista (PP), e de este partido ser o mais citado na “Operação Lava -Jato”, com 21 dos seus 50 deputados a contas com a justiça. Bolsonaro esteve 11 anos na direção do PP (saiu em 2016), e nunca se pronunciou sobre este tema. Um ano depois, admitiu numa entrevista que o PP tinha recebido dinheiro ilegal [propina] da JBS- Friboi para a campanha eleitoral de 2014: “O partido recebeu propina sim, mas qual partido que não recebe propina?”, relatava a “Folha de S.Paulo”. Ao jornal, Bolsonaro disse que foram depositados 200 mil reais (€46 mil euros) pela JBS-Friboi na conta pessoal dele, quantia que foi entregue ao partido. E o PP voltou a depositar o dinheiro na conta de Bolsonaro. “A Friboi não colocou nada na minha conta, foi o partido”, afirmou.
O “brio e aprumo militar” do candidato também são peculiares. Quando estava no ativo foi condenado por ter posto uma bomba no quartel, e sofreu várias punições por declarações e conduta impróprias (acabou absolvido no Supremo). Um documento secreto do Exército, dos anos 80, revelado pelo “Folha de S.Paulo” em 2017, referia “uma excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente”. O seu superior hierárquico à época, coronel Carlos Pellegrino, dizia que o então tenente Bolsonaro “tinha permanentemente a intenção de liderar os oficiais subalternos, no que foi sempre repelido, tanto em razão do tratamento agressivo dispensado aos seus camaradas, como pela falta de lógica, racionalidade e equilíbrio na apresentação de seus argumentos”.
Na corrida para as presidenciais de 7 de outubro, depois de muitas recusas, Bolsonaro acabou por escolher um general para vice-presidente: António Hamilton Mourão é militante do ainda mais pequeno Partido Renovador Trabalhista Brasileiro — 1 deputado em 531, e 1 senador em 81; o PRTB não tem capacidade de atrair mais eleitorado de direita porque limita o seu discurso político a sucessivos apelos à intervenção do exército. Mourão estreou-se como vice esta segunda-feira, a repetir que o Brasil herdou a “indolência” dos indígenas e a “malandragem” dos africanos. Este soundbite faz a delícias da redes sociais, onde Bolsonaro é rei, com 4,3 milhões de seguidores no Facebook, 450 mil no Twitter e 466 mil no Instagram; as redes sociais são, aliás, a sua principal fonte de propaganda e a única hipótese de passar a mensagem já que, em conjunto, o PSL e PRTB vão ter oito segundos e meio nos blocos de 12 minutos que serão transmitidos na televisão e rádio nacionais, três vezes por semana durante os 35 dias de campanha.