O primeiro-ministro afirmou esta quarta-feira que o arrendamento coercivo de casas devolutas já está previsto na legislação atual, incluindo numa lei que foi promulgada pelo antigo Presidente da República Cavaco Silva, a quem chamou o “sábio dos sábios”.
Falando no debate sobre política geral, na Assembleia da República, António Costa considerou existir uma “discussão talvez excessivamente redutora em relação a um ou outro ponto” do programa “Mais Habitação”, sendo “a mais extraordinária de todas” a “grande oposição a medidas que não são propriamente novas, são medidas que já existem”.
Em resposta ao líder do Chega, António Costa afirmou que “há muitos anos que o regime geral de urbanização e de edificação prevê a posse administrativa para efeitos de reabilitação e até o arrendamento forçado”.
“E mais recentemente, numa lei de 2014, a lei número 31/2014, que é a lei de bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território e do urbanismo, por exemplo no artigo 36, número um, que está em vigor e que nunca ninguém, que eu saiba, suscitou a fiscalização da sua constitucionalidade, mas quem o pode fazer está sempre a tempo de o fazer, diz o seguinte: os edifícios e as frações autónomas objeto de ação de reabilitação podem ser sujeitos a arrendamento forçado nos casos e nos termos previstos na lei”, precisou.
O líder do executivo salientou que “este diploma de 2014 foi assinado não por três marxistas ignorantes, mas por três pessoas sábias” e “nenhuma delas marxista”.
“Foi assinado em primeiro lugar pela presidente da Assembleia da República de então, a senhora doutora Maria Assunção Esteves, uma pessoa sábia e duvido que marxista, foi promulgado pelo professor doutor Aníbal António Cavaco Silva, sábio dos sábios, e que eu creio que seria uma enorme injustiça dar-lhe qualquer veleidade de marxista, e finalmente foi referendado pelo não menos sábio doutor Pedro Passos Coelho, que seguramente não é marxista”, salientou.
O primeiro-ministro argumentou que “a previsão de haver arrendamento forçado não é propriamente uma novidade, é algo que já existe na lei” e referiu mesmo que, “de todo o pacote, é o que tem menos novidade”, apontando que no “Programa Mais Habitação” “há muitas medidas com muita novidade”.
Na sua intervenção, o líder do Chega questionou António Costa se vai reformular este programa “para dar harmonia com as normas constitucionais” e “ir ao encontro do que disse o Presidente da República”, e ainda “se vai ou não deixar cair o arrendamento coercivo das habitações”.
André Ventura insistiu que o “Programa Mais Habitação” “só traz propaganda, ideologia e nada mais” e defendeu a demissão da ministra da Habitação, Marina Gonçalves.
“Se fosse ministro, escondia-me numa toca de coelho e não aparecia mais”, sublinhou.
O presidente do Chega considerou ainda que a credibilidade do primeiro-ministro, bem como dos ministros das Finanças e da Habitação (que apresentaram as medidas) “estão irremediavelmente postas em causa quando o Presidente da República diz que a lei não serve para nada” e questinou se “o Governo vai apresentar mais medidas fiscais”.
No debate, o primeiro-ministro destacou que “grande parte destas medias são da competência exclusiva da Assembleia da República”, nomeadamente “todas em matérias fiscais”.
E indicou que o Governo apresentou neste pacote “uma infinidade” de medidas a nível fiscal, que elencou mais à frente, e apontou que serão debatidas no parlamento.
“Vamos ter uma lei da Assembleia da República sobre esta matéria que então, sim, deve ser o objeto de apreciação por quem de direito e depois quem de direito também apreciará a apreciação que for feita por quem de direito”, acrescentou Costa, considerando que “cada um deve agir e falar no momento próprio”.
No sábado, Cavaco Silva considerou que a crise na habitação “é resultado do falhanço” da política do Governo”, manifestando “muitas dúvidas” quanto ao sucesso do pacote do executivo, que tem um “problema de credibilidade”.
Para o antigo chefe de Estado, “face a este conflito de direitos – direito de habitação e direito de propriedade – os marxistas ignorantes das regras da economia de mercado que vigora na União Europeia” dirão “que se proceda à coletivização da propriedade urbana privada”.
“Deixemo-los em paz com a sua ignorância”, disse apenas.