Em Portugal continua a ser frequente que entidades públicas e privadas solicitem cópias do Cartão de Cidadão a clientes e utentes. Contudo, na maioria dos casos, esse pedido não tem base legal. De acordo com o artigo publicado na revista Visão por Joel A. Alves, professor convidado da Escola de Direito da Universidade do Minho, a legislação nacional é clara quanto aos limites da reprodução deste documento e estabelece sanções em caso de incumprimento.
O tema voltou recentemente à discussão depois de um caso em Espanha, onde um operador turístico foi multado por exigir cópias desnecessárias dos documentos de identificação dos clientes.
Apesar de o episódio ter ocorrido no país vizinho, levanta uma questão pertinente também para os portugueses: afinal, quando é que é legal entregar a cópia do Cartão de Cidadão?
Lei portuguesa é clara
O artigo 5.º da Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro, que cria o Cartão de Cidadão, é inequívoco: é proibida a reprodução do documento “em fotocópia ou qualquer outro meio” sem o consentimento do titular, salvo se existir uma disposição legal que o imponha ou uma decisão de uma autoridade judiciária.
Isto significa que uma entidade privada, como um ginásio, uma imobiliária ou um hotel, não pode exigir a cópia do Cartão de Cidadão de um cliente, a menos que tal obrigação esteja prevista na lei. Fora desses casos, só é possível recolher uma cópia se o titular consentir voluntariamente, lê-se na Visão.
O que é um consentimento livre?
Segundo a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), o consentimento só é considerado válido quando é dado de forma livre e informada. Para isso, o titular deve dispor de meios alternativos para comprovar a sua identidade.
De acordo com a mesma fonte, essa verificação pode ser feita através da exibição presencial do cartão, da leitura eletrónica dos dados com um leitor próprio ou até da autenticação digital à distância. Se essas alternativas não forem oferecidas, o consentimento deixa de ser verdadeiramente livre e a recolha da cópia torna-se ilegal.
Como agir quando lhe pedem a cópia
Quando uma entidade solicita a cópia do Cartão de Cidadão, o cidadão tem o direito de perguntar se existe uma base legal para esse pedido. Se não houver, pode recusar a entrega e pedir que lhe seja indicado um método alternativo de identificação.
Segundo a mesma fonte, caso a entidade insista, o cidadão pode apresentar queixa ao Instituto dos Registos e do Notariado (IRN), responsável pelos processos de contraordenação relacionados com a violação da referida lei, ou à CNPD, que supervisiona o cumprimento das regras de proteção de dados.
Mesmo quando é obrigatório, proteja-se
A Visão recorda que, mesmo nas situações em que a cópia é legalmente exigida, o titular deve adotar algumas precauções. É recomendável datar a cópia, identificar a entidade a quem foi entregue e indicar a finalidade do documento. Também se aconselha a rasurar elementos desnecessários, como o número de contribuinte, quando não são relevantes para o objetivo em causa.
Estas medidas ajudam a reduzir o risco de uso indevido da informação pessoal, sobretudo em casos de violação de dados. Como refere a mesma fonte, conhecer a lei e agir com prudência continua a ser a melhor forma de garantir que a proteção da identidade não fica apenas no papel.