A 30 de março de 1922 Sacadura Cabral e Gago Coutinho iniciaram em Lisboa a travessia do Atlântico Sul. Esta viagem teve como objetivo fazer a ligação aérea entre os continentes europeu e sul-americano. Os dois intrépidos aviadores utilizaram um hidroavião monomotor Fairey F III-D MkII, especialmente concebido para a viagem, ao qual deram o nome de Lusitânia. Sacadura Cabral exercia as funções de piloto e Gago Coutinho as de navegador. Este último havia criado, e usaria durante a viagem, um horizonte artificial adaptado a um sextante, a fim de medir a altura dos astros, invenção que revolucionou a navegação aérea à época.
Depois de diversos contratempos amararam finalmente no Rio de Janeiro no dia 17 de junho de 1922, frente à Ilha das Enxadas, nas águas da baía de Guanabara, onde foram aclamados entusiasticamente.
Gago Coutinho e Sacadura Cabral acabavam de concluir com êxito não apenas a primeira travessia do Atlântico Sul, mas pela primeira vez na história da aviação, tinha-se viajado sobre o Oceano Atlântico apenas com o auxílio da navegação astronómica.
Apesar da viagem ter tido uma duração de setenta e nove dias, o tempo de voo foi de cerca de sessenta e duas horas, percorrido um total de 8.383 quilómetros.
No momento em que se comemora em Faro o Dia da Marinha que terá como tema o centenário da fantástica travessia do Atlântico Sul, realizada por estes dois portugueses ilustres, talvez não seja despropositado tecer algumas considerações sobre uma outra ligação, desta vez não por via aérea, entre Faro, mais precisamente o seu aeroporto, e o resto da Europa em que Portugal se integra.
É a forma encontrada para nos associarmos, manifestando o nosso apoio, à atribuição do nome “Gago Coutinho” ao aeroporto de Faro, não só pela homenagem que se presta a este ilustre descendente de Algarvios, mas também pelo simbolismo que tal ato representa de modernidade, bem caracterizada pelas inovações trazidas à aviação pelo génio científico, inventivo e criador do Almirante, que tanto nos honra.
Transportar para a actualidade as gloriosas memórias dum passado não muito longínquo, associando o aeroporto da nossa região à genialidade duma personalidade que tão estritamente está ligada a Faro, constitui uma digna forma de nos projetarmos no mundo.
Afigura-se-nos inteiramente adequado o “baptismo” do Aeroporto Internacional de Faro com o nome “Gago Coutinho”, divulgando desta forma a valia do contributo do Almirante e do Comandante Sacadura Cabral.
E como o nosso permanente propósito reside no encontrar as soluções que melhor sirvam a nossa região e o país, a nossa experiência duma vida dedicada aos sistemas de mobilidade conduzem-nos a expor, nesta tão apropriada ocasião, a ideia consolidada dum projeto de desenvolvimento, associando-nos à dignidade das comemorações do Dia da Marinha e ao glorioso feito de Gago Coutinho e Sacadura Cabral.
Como sabemos a rede europeia de alta velocidade chegou à cidade espanhola de Sevilha em 1992, ano em que se realizou nessa cidade a exposição universal. Por outro lado, Faro e o seu aeroporto distam cerca de duzentos quilómetros de Sevilha, ou seja, desde 1992 que Portugal está a menos de uma hora de viagem, em alta velocidade, de Sevilha e da consequente ligação à rede europeia de comboios de alta velocidade.
É estranho que, passados trinta anos, ainda não tenha sido construída uma linha de alta velocidade, em bitola europeia (bitola normal), ligando Faro e o seu aeroporto à rede europeia de alta velocidade ferroviária. Esta ligação teria, em nossa opinião, inúmeras vantagens para todo o Algarve e para Portugal, pois permitira transformar o aeroporto de Faro numa importante plataforma giratória de ligação do continente europeu com os continentes africano e sul-americano (alternativa e/ou complementar a Lisboa). Um investimento com estas características, com um custo estimado de cerca de 18 milhões de euros por Km (excluindo a construção da ponte sobre o rio Guadiana), será um importante fator de desenvolvimento da economia algarvia e do País. Criará centenas de postos de trabalho e contribuirá decisivamente para o desenvolvimento da atividade turística nacional.
A linha de alta velocidade entre Faro e Sevilha poderá vir a dispor, se for esse o entendimento dos nossos vizinhos espanhóis, uma paragem intermédia na cidade de Huelva e ser utilizada parcialmente, também, por comboios inter-regionais, do tipo Tran Train, que assegurarão a distribuição de passageiros entre Lagos e Vila Real de Santo António, servindo como alimentadores dos comboios de alta velocidade a partir do aeroporto de Faro. O serviço Tran Train poderá circular exclusivamente em território português, assegurando a mobilidade entre os principais centros urbanos algarvios ou, como seria desejável, circular em Espanha, com a função de distribuição de passageiros.
A construção da infraestrutura de alta velocidade ferroviária entre o aeroporto de Faro e Sevilha é um investimento estratégico que poderá ser complementado por um outro investimento necessário na linha do sul, ou seja, o de criar as condições para que os comboios de alta velocidade cheguem a Lisboa, assegurando que a ligação entre o aeroporto de Faro e a capital – Lisboa – se faça em cerca de cerca de uma hora e trinta minutos. Esta nova linha de alta velocidade, em bitola europeia, deveria servir o aeroporto de Beja e o novo aeroporto de Lisboa, em Alcochete. Desta forma interligavam-se três das principais infraestruturas aeroportuárias do País.
Adiar a decisão de avançar para o projeto e posterior construção destas ligações ferroviárias em alta velocidade e bitola europeia é condenar o Algarve, Faro e o seu aeroporto, bem como a restante infraestrutura aeroportuária do País a perdas de competitividade relativamente aos nossos vizinhos Espanhóis, comprometendo o futuro, o combate à desertificação do interior sul e o necessário crescimento socioeconómico de todo o sul de Portugal.
Que os estrategas se interliguem aos decisores por forma a daí resultar o desejado salto civilizacional em matéria da mobilidade e da coesão, promovendo o desenvolvimento desta região que tão marginalizada se tem sentido.