O fato preto e a máscara de proteção, em forma de bico de pássaro, usados pelos médicos na assistência aos doentes atingidos pela peste negra estão entre as peças mais procuradas no Museu da Farmácia.
Durante as visitas virtuais que o museu está a realizar às escolas, a reação dos alunos é de surpresa ao constatarem nos vídeos preparados para explicar este período da história da saúde e da farmácia que apenas alguns médicos usavam máscara de proteção, contou à agência Lusa o curador do museu, Gonçalo Magano.
“É muito engraçado, são crianças e a reação que têm primeiro é ´então onde é que estão as máscaras?’”, relatou o curador, que também participa nestas visitas, durante as quais explica que agora a população usa máscara, mas que à data só o médico é que usava essa proteção. “E mesmo assim não eram todos”, afirmou.
Neste módulo da visita, revela-se a primeira máscara de proteção, no contexto da peste negra, e surge a segunda reação da plateia – “Bem, isto antes parecia bem pior!”.
Para Gonçalo Magano, a pandemia de covid-19 é “o tormento do século XXI”, mas deve ser apresentada aos alunos no contexto de outras doenças, como a peste negra ou a gripe espanhola, vivida há cem anos. “Obviamente que temos de falar das coisas à medida do seu tempo e nunca desvalorizando o grande problema pelo qual estamos a passar (…), mas quando mostramos o impacto que teve uma peste negra ou uma gripe espanhola (…) acho que surge aqui alguma força, alguma esperança de que as coisas vão correr bem e que o ser humanos com menos do que tem agora já conseguiu dar a volta às coisas”, defendeu.
A ideia está a ser bem acolhida por alunos e professores, o que permitiu ao museu avançar para o passo seguinte e abrir inscrições para o público em geral. Neste momento está em cima da mesa a possibilidade de uma família agendar uma data para visitar o museu a partir de casa. Através das redes sociais é possível passar uma hora no museu.
“Os museus têm como missão partilhar os objetos e a história deles, nada substitui uma visita física ao museu, estar com os objetos que fazem parte da História. Mas vivemos num país que é muito mais do que Lisboa e Porto, num país que tem ilhas, e esta visita virtual não só se torna acessível a qualquer canto do país, qualquer escola de Évora, de Beja, do Algarve – embora tenhamos várias escolas que nos visitavam e que faziam estes quilómetros todos – como agora estamos muito mais apetecíveis àqueles que estão longe”, sustentou.
Criada em tempo de crise, a medida veio para ficar, assegurou o curador: “Mesmo depois de tudo isto terminar, este é um produto que se poderá renovar. Hoje temos estes oito temas, mas nada dos diz que daqui a um ano e meio não tiramos as máscaras da peste e a luta contra as epidemias para colocar outro tema que entre em voga e que faça sentido falar dentro da História da Saúde”.
Na vasta e diversificada coleção do museu a peça que mais tem captado a atenção dos visitantes, “pela sua atualidade” é a máscara da peste negra, “sem dúvida alguma”, referiu Gonçalo Magano.
“Relaciona-se com uma peste, uma doença, com uma das doenças mais conhecidas. Temos a gripe espanhola, que foi devastadora, mas a peste negra está mais na memória das pessoas, não só pelo nome, mas pela sua dimensão” e pela insuficiência de meios, admitiu.
Se a gripe espanhola foi desoladora há cem anos, a peste negra teve três surtos: século XIV, século XVII, século XIX e “ainda há casos de peste negra neste momento nos EUA”.
Outros clássicos que atraem a atenção do público são um sarcófago do Antigo Egito, onde saúde e religião “andavam de mãos dadas” e peças pré-colombianas, como vasos usados pelos maias, incas e astecas na preparação e conservação de remédios.
As máscaras africanas usadas pelos curandeiros e feiticeiros, as farmácias portáteis doadas pela NASA e que estiveram a bordo do Space Shuttle Endeavour são também motivo de espanto e admiração, numa coleção que já incorporou as primeiras peças recolhidas no âmbito da pandemia de covid-19, como máscaras e material para testes de deteção do agora novo coronavírus.