O livro “Eliete – A vida normal”, de Dulce Maria Cardoso, está na lista de candidatos ao Prémio Femina, criado em 1904, em França, na categoria de melhor romance estrangeiro, publicado no país, divulgada na segunda-feira à noite.
“Eliete – A vida normal”, editado em Portugal em 2018 pela Tinta-da-China, é um dos 15 romances estrangeiros integrados na primeira lista de candidatos divulgada pela organização do Prémio Femina.
O romance de Dulce Maria Cardoso “Eliete – la vie normale” foi editado em França pelas Editions Chandeigne, com tradução de Elodie Dupeau.
Na segunda-feira à noite, além dos romances estrangeiros, foram também divulgados os primeiros 18 romances franceses da lista de candidatos deste ano ao Prémio Femina.
As próximas listas de candidatos serão divulgadas em outubro e os vencedores serão anunciados em 03 de novembro.
O Prémio Femina foi criado em 1904 por 22 colaboradores da revista feminina La Vie Heureuse e teve sempre um júri composto exclusivamente por mulheres, em protesto contra o júri do Prémio Goncourt, formado apenas por homens.
Em 1985, foi criado o Prémio Femina Étranger, que já distinguiu autores como Javier Marias, Antonio Muñoz Molina, Richard Ford, Sofi Oksanen, Ian McEwan, Julian Barnes e Joyce Carol Oates.
Em 1990, Vergílio Ferreira venceu o Prémio Femina Étranger com a tradução francesa de “Aparição”.
“Eliete – A vida normal” centra-se numa mulher de meia idade, caracterizada pela mediania em tudo, casada e mãe de duas filhas, agente imobiliária, que se sente insatisfeita com a vida e com o casamento, e que, na procura de mudança – vontade desencadeada na sequência da hospitalização da avó, com sinais de Alzheimer – vira-se para as conquistas através da internet e das redes sociais, que no romance têm um papel central.
“A grande dificuldade destes tempos é fazer coincidir o eu digital com o eu real e ultrapassar o facto de nós estarmos sempre a ser avaliados”, disse a escritora em entrevista à agência Lusa, em 2018, aquando da edição de “Eliete – A vida normal”.
Um ‘like’ a mais ou a menos faz sempre mossa, “porque os ‘likes’ são agora as palmas de antigamente, é uma maneira de dizer ‘gosto de ti’, ‘estás bem’, e pressupõe sempre uma comparação com os outros, quem tem mais gostos e quem tem mais comentários”.
Esta é uma realidade que não pode ser ignorada, porque a “vida editada também é vida” e a grande dificuldade reside em conciliá-la com a vida real.
No romance, Eliete começa a ensaiar traições ao marido através da rede social Tinder, ideia através da qual a autora explora o dilema da traição e do adultério real e virtual.
O romance começa com uma referência a Salazar e termina com uma carta do ditador, que deixa em aberto o desenvolvimento do enredo no próximo volume.
A ideia desta personagem inusitada surgiu do questionamento de quem é esta geração pós 25 de Abril, e que país é este que ficou da revolução que deitou abaixo a ditadura.
A avó de Eliete e a sua demência desempenham na história também um papel fundamental, por um lado, por uma questão metafórica, porque ela tem mais ou menos a idade dos anos que advêm da Segunda Guerra Mundial, e simboliza a demência de que padece o “corpo social”, que, esquecido da guerra, rapidamente se deixou arrastar pelo fascismo.
Por outro lado, a situação clínica da avó reflete uma preocupação da autora com a incapacidade física e financeira das famílias para cuidarem dos idosos e da falta de respostas sociais para as situações de dependência em fim de vida: “Eu começo por não perceber porque nos querem prolongar tanto a vida, se depois não sabem o que fazer connosco”.