Não há água, aquecimento, eletricidade. A comida e os medicamentos também escasseiam – e os poucos serviços que ainda têm alguma água ou comida deparam-se com longas filas de pessoas à sua porta. Ferrovias, pontes e comboios foram destruídos ou danificados pelos ataques constantes das forças russas. Há casas incendiadas, hospitais e infraestruturas danificadas e os residentes da cidade escondem-se em caves, isolados da informação do mundo exterior. As comunicações móveis foram cortadas. Tudo o que sabem é o que ouvem lá fora, as explosões e bombardeamentos russos que cercam as cidades.
Até este sábado, os residentes de Mariupol e de Volnovakha estavam encurralados dentro da sua própria cidade. De tal forma que as autarquias acusaram Moscovo de criar uma “catástrofe humanitária” nas regiões. Mas as negociações entre a Rússia e a Ucrânia abriram uma brecha por onde esperam ser possível escapar. O Ministério da Defesa russo anunciou a abertura de corredores humanitários nas duas regiões a partir das 10h em Moscovo (7h em Lisboa), por onde poderão sair cerca de 200 mil civis de Mariupol e 15 mil de Volnovakha e entrará comida e medicamentos nas cidades. Mas o Governo ucraniano já veio dizer que o cessar-fogo não está a ser respeitado em todo o corredor humanitário.
“A situação é terrível”, publicava esta semana no Telegram a autarquia de Mariupol, citada pela agência noticiosa Ukrinform. “Mariupol continua a viver sem eletricidade, água e aquecimento, na sequência dos bombardeamentos constantes dos ocupantes russos. Existem também problemas sérios com as comunicações móveis. Ao mesmo tempo, os fornecedores destes serviços públicos disponibilizam combustível aos geradores que abastecem os hospitais públicos com eletricidade, garantindo assim a disponibilização de cuidados médicos de emergência aos feridos.”
“Estamos basicamente a ser destruídos”, acrescentava o presidente da câmara desta cidade portuária estratégica com 450 mil habitantes, localizada junto ao mar de Azov, que, se conquistada, permitirá à Rússia criar um corredor terrestre até à Crimeia, anexada em 2014 por Moscovo (ainda que a anexação não seja reconhecida por grande parte do mundo ocidental). “Os russos querem apagar Mariupol e os seus residentes da face da Terra.”
À noite, a escuridão é total – à exceção da luz das explosões que vai pontuando o céu. Muitos dos residentes fugiram para o centro da cidade para evitar os bombardeamentos nos arredores. A maioria esconde-se nas caves dos edifícios, a partir das quais ouve os bombardeamentos a aproximar-se. “Há choro, medo, incerteza e pânico”, conta à Aljazeera um jovem empreendedor ucraniano.
Em Volnovakha a situação não é mais animadora. Cerca de 90% da cidade com 21 mil habitantes, situada na região de Donetsk no leste do país, pouco acima de Mariupol, foi danificada pelos bombardeamentos, noticia o “Guardian”. Veem-se cadáveres nas ruas, que não puderam ser recolhidos, e os residentes têm permanecido escondidos até este sábado. Com as comunicações móveis cortadas, recorrem ao Telegram para procurar por familiares desaparecidos.
“A cidade está a ser destruída”, disse um dos residentes à Radio Free Europe. “Bombardeamentos diretos ao hospital. Casas incendiadas. Saqueadores prosperam – roubam comida, telemóveis, eletrodomésticos. Os residentes estão nas caves, sem acesso a informação exterior. Não existe luz, água, aquecimento ou comunicações móveis.”
A cidade está cercada pelo inimigo, realça ainda o representante da região administrativa de Donetsk, Pavlo Kyrylenko. E até este sábado era “impossível evacuar a população” ou até fazer-lhes chegar bens tão simples como “pão e água.”
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL