Que têm estes três nomes em comum?
São os títulos, apresentados por ordem cronológica, de três novas publicações periódicas, em papel, editadas no Algarve, com o seu primeiro número em 2017.
Garanta
Da primeira, «Garanta, Revista de Letras, Artes e Cultura», saiu o número 0 (zero, do qual foram feitos 80 exemplares) no passado mês de maio. Sobre o nome dado à publicação, um dos seus mentores, Paulo Correia, explicou-me, quando lhe perguntei: «Garanta de garantismo, numa era em que nada se garante, estamos em última hipótese a tentar garantir a literatura, a palavra escrita». Na apresentação (p.7), em forma de manifesto de intenções, este mesmo autor explica que um dos propósitos da revista é traduzir «uma certa ideia de colectivo num período de profundo individualismo, do qual a violência instalada é apenas um sinal da intolerância individual. Escrevemos livremente, contra todo o tipo de intolerância». E continua, afirmando que é «de celebração da palavra escrita que se trata, aliando a palavra a outras manifestações artísticas».
Pretendendo que o facto de ser uma revista produzida no barlavento algarvio (está datada de Portimão e com Lagos como local de impressão) não faça dela uma publicação local, explica que «é o primeiro ensaio de uma revista radicada no sul de Portugal (no Algarve), mas que não pretende limitar-se a fronteiras territoriais, pois onde existir um leitor esse será o nosso território».
Este número é composto por 35 páginas, nas quais podemos encontrar prosa, poesia (e prosa poética) e ilustração (uma delas com a técnica de colagem), sempre a preto e branco. Graficamente, «Garanta» optou por estilo retro, com um tipo de letra «de máquina de escrever» que faz recordar aquelas fanzines dos anos 80 do século passado, memória reforçada pelo tamanho (que corresponde a uma folha A4). Gostei do estilo provocatório e, como se reclama semestral, aguardo, para breve, o número 1.
Cadernos de Poesia a Sul
Em julho, no primeiro dia da FLO (Feira do Livro de Olhão), o poeta Fernando Cabrita apresentou o 1º número destes cadernos de que é coordenador, cujo nº 2 saiu em novembro, durante o «III Encontro Internacional de Poesia a Sul», que decorreu em Olhão, de 3 a 12 deste mês. Os «Cadernos Poesia a Sul» são de distribuição gratuita, inteiramente patrocinados pela Câmara Municipal daquela cidade, que se tem mostrado especialmente favorável à ideia de pôr Olhão no mapa de um certo turismo cultural, como o demonstram todo o incentivo (e financiamento) dado quer a estes encontros, quer à FLO, quer ao percurso das lendas (pontificado pela estátua da Floripes, a mais famosa moura local) ou aos novos graffiti que contam parte da história da cidade.
Pretende-se que esta publicação seja trimestral ou quadrimestral. Em cada número, há um poeta homenageado, numa rubrica intitulada «In Memoriam», com que termina cada volume: o nº 1 foi dedicado ao poeta João Lúcio (Olhão, 1880- Olhão, 1918) e o nº 2 a Rafael Cansinos Assens (Sevilha, 1882 – Madrid, 1964). A intenção transnacional, de «fraternidade da escrita poética», está patente no slogan (explicado na contracapa) dos «Cadernos»: «Publicam-se em Olhão, fazem-se no mundo, lêem-se em toda a parte».
Os «Cadernos Poesia a Sul» são constituídos exclusivamente por poesia: para cada poeta representado há uma pequena biobibliografia, mas o que se destaca são os poemas, na sua maioria originais. Multilingue (alguns traduzidos em outras línguas, podendo alguns poemas serem lidos em quatro idiomas diferentes, como os de Uberto Stabile, pp.67-73), reflete a variedade de participantes nos encontros, mas não se limita a estes. Uma boa oportunidade para se poder ler alguma da poesia contemporânea que se faz por este mundo fora.
LÓGOS. Biblioteca do Tempo
A mais recente destas edições é a revista «LÓGOS. Biblioteca do Tempo», publicada em setembro. Iniciou-se como um projeto online, no Facebook, num blogue e depois na versão em papel, percebendo-se que todos estes meios confluem para o mesmo fim: a divulgação de um projeto com propósitos muito específicos, como afirmam os seus editores (Adília César e Fernando Esteves Pinto, com assistência de Adão Contreiras), que são o «dissolver a espuma de futilidade que teima em acumular-se no tempo presente». A revista (do projeto homónimo) reflete também, «regularmente sobre algumas questões na procura de um entendimento relativo ao meio cultural e literário. (…) pretende dar voz ao pensamento crítico no âmbito da literatura, filosofia e psicologia, tendo como linha condutora a nossa percepção de qualidade, de acordo com critérios de liberdade de expressão, criação artística e estética, e procura de conhecimento. (…) é independente em relação a quaisquer orientações políticas, religiosas e ideológicas ou escolas teóricas; divulga textos literários (ficção, poesia, recensão crítica, artigos de opinião, ensaios) e ilustrações de autor» (pp.3-4).
O nº 1 da LÓGOS foi ilustrado por Reinaldo Barros. As rubricas (Ensaio, Entrevista, Literatura e Poesia), pelo que percebi quando conversei com os editores, poderão variar de número para número, assim como o artista plástico convidado. A maioria do que ali se publica é tendencialmente original, havendo, inclusive, uma estreia da escritora Cristina Carvalho (filha de dois outros escritores: Rómulo de Carvalho/António Gedeão, e Natália Nunes), autora solidamente representada no Plano Nacional de Leitura. Na entrevista que lhe é feita (pp. 45-53), afirma: «Eu escrevo poesia desde sempre. Não. Não publico. Sou muito difícil, relativamente a esse género de literatura. Continuo cheia de dúvidas». Mas entre a saída da entrevista na Internet e a publicação da revista (felizmente), reconsiderou e, por isso, nas pp. 95-99 podem ler-se alguns dos seus poemas (até agora) inéditos.
Toda esta dinâmica editorial de revistas contribui para a divulgação da reflexão e da produção artístico-literária que se faz atualmente.
(Artigo publicado na edição papel do Caderno Cultura.Sul de Novembro)