Toda a paisagem algarvia se encontra salpicada de lugares a que o povo chama Castelo. Esta designação aplica-se, em regra, a lugares situados num local elevado em relação aos terrenos circundantes e que se julga, por isso, estarem naturalmente protegidos, e onde se encontram vestígios de muralhas antigas, mais ou menos arruinadas, ou onde é tradicional voz corrente estas terem existido – mesmo que de elas já se não apreciem indícios.
Esta denominação comum é, contudo, aplicada a realidades muito distintas: recintos pré-históricos delimitados por muralhas – como o Castelo de Santa Justa (Alcoutim), o Castelo de Corte João Marques (Loulé) ou Alcalar (Portimão), topónimo derivado do árabe ‘Qalat’, que significa castelo –; assentamentos fortificados da época romana – como o Castelinho dos Mouros (Alcoutim), um edifício residencial da primeira fase da ocupação romana do Algarve, anterior à fundação da província da Lusitânia –; recintos fortificados da época islâmica – sejam eles alcáçovas (que albergam áreas palatinas e militares) de cidades (medinas), como os castelos de Silves (da ‘madinat Xilb’), de Tavira (da ‘madinat Tabira’), de Loulé (da ‘madinat al’Uliã’) e de Faro (da ‘madinat Ukxunuba’), sejam eles fortalezas apartadas que albergam áreas residenciais, como o Castelo de Paderne, o Castelo Velho de Alcoutim, ou o Castelo Belinho (Portimão) – que testemunham conjunturas históricas variáveis de um tempo longo que se estende do Emirato de Córdova no século VIII à conquista portuguesa em meados do século XIII; fortalezas da época medieval cristã – com frequência reocupando e modificando as antigas muralhas dos castelos islâmicos ou edificando de raiz cidadelas em povoações doadas pela coroa portuguesa, como o Castelo de Lagos.
No século XVI, a introdução em Portugal, e no Algarve, das armas de fogo na defesa e ataque dos recintos fortificados teve como consequência uma profunda alteração na arquitetura militar, com a introdução dos bastiões, o rebaixamento das torres e a concentração das defesas ativas em pontos estratégicos – e ditou o progressivo apagamento dos castelos como dispositivos de guerra.
Sinal de prestígio político e de domínio territorial, as muralhas dos castelos confundem-se por vezes com as muralhas das medinas, ou dos pequenos povoados fortificados muçulmanos – como Salir ou Aljezur –, ou das cercas vilãs portuguesas da baixa Idade Média – como o recinto de Castro Marim, que abarca nele a vila velha (hoje abandonada como área residencial) e o alcácer, conforme bem ilustram os desenhos de Duarte d’Armas incluídos no «Livro das Fortalezas do Reino», de cerca de 1509 (um levantamento exaustivo do estado das fortalezas fronteiriças, do Minho ao Algarve, ordenado pelo rei D. Manuel, que, no extremo Sul, inclui também a vila de Alcoutim).
Do total dos castelos edificados no Algarve entre a pré-história e a baixa Idade Média, apenas uma escassa dezena se encontra patrimonializada (isto é, reconhecida oficialmente como herança cultural da nação portuguesa ou das comunidades municipais). Os castelos constituem porém uma marca da identidade regional (alimentando mesmo o mito de que são algarvios aqueles castelos que passaram a figurar na bandeira nacional após a conquista da região por D. Afonso III). A sua diversidade (como atrás se sublinhou), relativa proximidade (possibilitando a visitação de uma rota regional dos castelos) e fácil acessibilidade, fazem deles um apetecível ativo cultural, social e económico: um convite a um maior investimento estatal na sua reabilitação ao serviço da comunidade, para educação, deleite e desenvolvimento económico, e fonte de criação de emprego.
(Artigo publicado no Caderno de Artes Cultura.Sul)
(CM)