A 13 de fevereiro foi inaugurada a exposição “3 Graças” de Pedro Cabrita Reis no Jardim das Tulherias, junto ao Museu Louvre, em Paris, no âmbito da Temporada Cruzada França-Portugal 2022”, contando com a presença do Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa.
Ao longo da história da arte, as três graças têm sido recorrentemente representadas por grandes artistas. Da mitologia grega até à arte contemporânea estas três figuras personificam os ideais de beleza feminina correspondentes às diferentes épocas e artistas. Às “Graças” era atribuído o poder de conferir aos artistas e poetas a habilidade para criar o belo.
Deusas do amor, conhecidas como “Graças”, eram três jovens que, segundo o poeta Hesíodo, seriam filhas de Zeus e Eurínome, uma ninfa do mar com quem o deus do Olimpo teve um breve caso de amor. As três graças chamavam-se Aglaia, Euphrosyne e Thalya, e estavam sempre juntas. Além do amor e da beleza, as jovens também eram associadas à natureza, criatividade, fertilidade, charme, esplendor e alegria.
Nas primeiras representações plásticas, as Graças apareciam vestidas, mas mais tarde foram representadas como jovens nuas, de mãos dadas, olhando duas das Graças numa direção e a terceira na direção oposta.
Foi especialmente durante a Renascença que este tema se tornou recorrente na pintura, ocorrendo materializações a partir de obras anteriores. Foi o caso da pintura a óleo sobre cobre feita a partir da gravura de Agostino Carracci, em que as “3 Graças” aparecem sexualmente pouco expressivas.
Também na pintura de Rafael destaca-se a palidez e o olhar indiferente das personagens, não sendo expostos os seios e os órgãos sexuais aparecendo de forma discreta, lembrando corpos de adolescentes, parecendo que o ideal de beleza reside na juventude.
Um pouco diferente da representação de Rafael é a do pintor Rubens, que optou por Graças mais maduras, com corpos e formas mais opulentas, cruzando os olhares, sugerindo mais intimidade. A composição, porém, é praticamente a mesma, pois duas das graças são vistas frontalmente, enquanto a outra é representada por trás.
No início do século XX, quando os movimentos de vanguarda europeus estavam no auge, Robert Delaunay pintou as 3 Graças na “Ville de Paris”, fragmentando as personagens.
Assim, embora os personagens sejam as mesmos, as representações ao longo do tempo mudaram muito, mostrando que o ideal de beleza é dinâmico e muda ao longo do tempo.
No caso da obra de Pedro Cabrita Reis, houve uma reinterpretação do tema “3 Graças”.
Esta reinterpretação expressa a importância do pensamento e do planeamento da obra no processo de produção artística. Em geral, as obras artísticas são concretizadas por quem as concebe, mas verifica-se que, na arte contemporânea, muitas vezes quem pensa sobre o produto artístico não é quem o executa. Assim, a perspetiva de “manualidade” do artista tem vindo a ser alterada, sobretudo a partir dos anos 60, com a emergência da arte concetual. No entanto, atualmente verifica-se uma conciliação entre a importância das ideias e o seu suporte material ou plástico, sendo superada a perspetiva da “desmaterialização da arte” ocorrida no século passado.
Expressando a importância da dimensão ecológica e da sustentabilidade na atualidade, através da cortiça, usou também outros materiais para tornar as peças mais resistentes ao facto de serem colocadas ao ar livre. Cada peça escultórica tem cerca de 4,50 metros e pesa aproximadamente 500 quilos, a que se somam os 400 quilos da base que as sustenta. Na concretização desta obra, contou com a “ajuda” de um braço robótico que esculpiu a cortiça de acordo com um programa de computador.
Ao longo da história da arte, as “3 Graças” têm sido sempre três figuras femininas entrelaçadas entre si, nunca se afastando. Na obra de Pedro Cabrita Reis as três esculturas, embora conceptualmente unidas, estão fisicamente separadas, representando a expansão da sua presença, tornando esta mais forte, o que pode representar a mulher atual no mundo ocidental, com mais poder e uma presença mais forte e determinante, embora a cortiça permita manter uma “fragilidade interessante”, segundo as palavras do artista.
Pedro Cabrita Reis é um dos artistas contemporâneos portuguesas mais reconhecido internacionalmente, tendo inclusivamente representado Portugal na Bienal de Arte de Veneza, em 2003, e reside no Algarve.
As suas “3 Graças” podem ser vistas em Paris até final de junho. Depois talvez venham para o Algarve, como o próprio afirma: “Um dia, se calhar, encontro um jardim, ou no meio do campo, lá para a serra do Algarve, onde moro, e ponho-as lá no meio das alfarrobeiras”.
* Professor Catedrático da Universidade do Algarve;
Pós-doutorado em Artes Visuais;
http://saul2017.wixsite.com/artes