A “severidade” dos efeitos das alterações climáticas no sector da água obriga à “mudança de paradigma” na gestão deste recurso em Portugal, que deve adaptar-se e adoptar medidas para retardar estas consequências, defendeu um responsável da área.
“A severidade com que os efeitos das alterações climáticas se estão a fazer sentir sobre o sector da água e sobre os serviços de água e saneamento dizem-nos, já hoje, que não estamos perante um desafio”, mas sim “o desafio das próximas décadas”, disse Rui Godinho, da Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas (APDA).
À margem do Encontro Nacional de Entidades Gestoras de Água e Saneamento (ENEG), que decorreu esta semana em Évora, o presidente da Assembleia-Geral da APDA argumentou à Agência Lusa que, perante as alterações climáticas, há que repensar a forma de gerir a água e tomar medidas.
O responsável aludiu a projecções recentes de investigadores, nomeadamente ao estudo de um grupo de trabalho da Universidade de Newcastle (Inglaterra), dirigido pela portuguesa Selma Guerreiro, sobre as três bacias hidrográficas ibéricas, do Douro, Tejo e Guadiana.
Nas conclusões, referiu, a investigação prevê “a hipótese de virmos a ter secas cada vez mais frequentes nas três bacias ibéricas”, assim como “secas muito mais duradouras, que podem ir até 10 e 15 anos, numa situação extrema”.
“Isso significa que estamos perante o desafio” de “termos que mudar completamente o paradigma da gestão da água, de maneira a adaptarmo-nos e/ou a tomarmos medidas” para “retardar que esses efeitos se façam sentir dessa forma tão violenta”, defendeu.
Portugal tem de proteger as origens de água que já possui
E a gestão da água, para as próximas décadas, alertou Rui Godinho, “toca, transversalmente, tudo, a política, a economia, os comportamentos, a vida em sociedade e a organização das cidades”.
Como exemplo do que precisa de ser analisado e decidido, Rui Godinho indicou que Portugal tem de proteger as origens de água que já possui e deve reforçar-se com novas infra-estruturas.
Portugal “tem um Plano Nacional de Barragens, lançado em 2005/2006”, mas “algumas barragens estratégicas para este fim não foram construídas, nomeadamente no interior”, criticou, apontando os casos de Girabolhos, no Mondego, e Alvito, no rio Tejo (construção foi cancelada em 2016).
Trata-se de projectos “absolutamente fundamentais para garantir essa capacidade de armazenamento de água nos anos que chove para os anos em que não chove”, reivindicou Rui Godinho.
A “regionalização dos recursos hídricos” foi outra das medidas que preconizou, defendendo que as administrações de região hidrográfica, que foram integradas na Agência Portuguesa do Ambiente, devem voltar a ser autónomas.
As alterações climáticas e os desafios que o sector da água enfrenta foram o tema em foco na edição deste ano do ENEG, cujos trabalhos terminam esta quinta-feira, 23 de Novembro.
Esta foi “a maior conferência de sempre do sector da água em Portugal”, com 537 participantes, 190 comunicações e uma feira com 52 expositores, indicou Rui Godinho.