Nuno Guerreiro nasceu em Faro há 45 anos. Sempre viveu em Loulé, mas com apenas 15 anos rumou ao Conservatório Nacional de Lisboa em busca do seu sonho. Começou por dançar, mas a professora Cristina de Castro não deixou passar ao lado a sua voz. Posteriormente, cantou com Rodrigo Leão e Carlos Paredes, que o convidou para actuar consigo num concerto. Foi nesse espectáculo que Manuel Paulo conheceu Nuno Guerreiro e, depois de uma audição conjunta com João Gil, encontraram a voz que precisavam para o seu projecto. Nasce assim a Ala dos Namorados.
Ao POSTAL, Nuno Guerreiro revela quais as suas ambições para o futuro e quais os momentos mais marcantes da sua carreira. Por fim, revela ainda, quais as surpresas para o próximo concerto da banda, em Loulé.
Quem é o Nuno Guerreiro, para além de uma das melhores e maiores vozes portuguesas?
Para já é um homem, uma pessoa, um Ser Humano. Considero- me uma pessoa difícil, porque sou diferente e nada o fiz para tal. Levei algumas pancadas durante todo este percurso e se calhar ainda continuarei a levar. Porque eu sou demasiado sensível, transparente, autêntico, espontâneo e verdadeiro. Isso às vezes cria muitas amizades, mas também cria muitas inimizades. Quando tu és verdadeiramente autêntico e não tens problemas em ser como és, as pessoas chocam com essa autenticidade, porque não é fácil. Na vida toda o que existem mais é máscaras e eu opto por ser verdadeiramente eu em qualquer situação. Isso é difícil, não digo que não seja, mas eu prefiro ser assim.
Quem gosta de mim e quem me conhece verdadeiramente, dá-me valor porque sou assim. Mas sou muito crítico, exigente da minha pessoa e dos outros, tenho imensos defeitos. Sou do signo virgem, o meu signo é muito pés na terra, mas muito artístico e sonhador. Depois, tenho ascendente em gémeos e os gémeos estão sempre na lua. O meu lado artístico vem dos dois signos. Dizem também que têm dupla personalidade, mas eu diria várias personalidades. Porque um artista quando se autodenomina artista – que é o meu caso – tem várias personagens. Não se faz por isso, é-se assim. Eu acredito no amor. Sou muito amigo do amigo verdadeiro, sonhador, apaixonado pela vida e pelas pessoas.
Quando era criança já tinha o sonho de ser cantor?
A minha mãe conta, que eu dizia que a minha vida seria no palco. Eu tinha consciência disso. Não sabia se era a cantar, se era a dançar, ou no teatro, mas sabia que algo ia acontecer. Sempre cantei, sempre tive consciência de que tinha voz e sempre soube que era diferente. Os outros rapazes gostavam de futebol e de motas, eu era teatrinhos, cantar, imitar artistas.
Quando era miúdo cantava tudo o que eram êxitos da altura. Também já ouvia muita coisa, Trovante, Vitorino, Zeca Afonso, fado. Hoje, sou completamente rendido à obra de George Michael e identifico-me muito com a vida dele, a nível artístico.
Quando é que se apercebeu das potencialidades da sua voz?
Comecei a aperceber-me mais tarde. Aos 15 anos saí de Loulé não para cantar, mas para dançar. Dancei muitos anos, fiz o Conservatório, dancei com coreógrafos independentes e estagiei na Companhia Nacional de Bailado. Eu andava sempre a cantar por todo o lado e a minha voz soava nos corredores do Conservatório. E, para a altura, a minha voz era muito diferente, muito aguda, muito redonda e, naturalmente, colocada. Eu era quase um soprano com 17 ou 18 anos.
Eu sabia que cantava bem porque as pessoas gostavam de me ouvir e pediam muitas vezes para eu cantar. Uma vez estávamos num jantar e eu comecei a cantar o tema “Pomar das Laranjeiras”, dos Madredeus, e o restaurante parou para me ouvir cantar. Estavam lá uns estrangeiros que ainda pagaram para eu cantar mais.
Depois, já no Conservatório, a grande soprano Cristina de Castro – que cantou com a Maria Callas – ouviu-me a cantar. Ela abriu a janela do primeiro andar e disse: “eu quero-te aqui em cima!”. Andei fugido cinco dias, até que um dia alguém me levou até ela. Eu vocalizei e ela referiu: “tu não tens consciência da voz que tens”. Mais tarde, explicou-me que eu era um contratenor, uma voz rara, uma voz diferente.
A partir daí, coisas aconteceram naturalmente na minha vida.
A partir daí começou a cantar?
Sim. Quando tinha 18 anos, fui ao Kremlin com os meus colegas e comecei a cantar a música que estava a passar na discoteca, a “Back to Life”, dos Soul II Soul, e quem é que estava atrás de mim? O grande músico Paulo Abelho, dos Sétima Legião. Ele no meio do barulho conseguiu ouvir-me cantar e veio dizer-me “grande voz. Vou deixar-te o meu contacto e provavelmente no futuro tenho trabalho para ti”. Eu na altura dei o meu contacto mas não levei a sério. Um mês depois ligou-me e disse- -me que tinha um trabalho para mim no São Luís. Quando lá cheguei apercebi-me que eram os Diva que estavam a preparar um concerto e que precisavam de duas vozes de apoio. Foi assim que passei a fazer parte dos ‘backing vocals’ dos Diva durante dois anos
Mais tarde, a vocalista Natália Casanova foi convidada pelo Carlos Paredes para um grande espectáculo. No ensaio, eu estava a cantar com a Natália quando o Carlos Paredes parou a música e perguntou: “quem é que estava a cantar aí?”. Fiquei a tremer por todos os lados, estava tão nervoso que a minha voz não saiu. Quando me acalmei e consegui cantar, ele disse-me: “o amigo não quer vir cantar comigo em espectáculos? Teria todo o prazer”. Este foi o grande salto da minha vida, e logo com um dos grandes ícones da música portuguesa.
Como foi a fase dos 15 anos, em que saiu do Algarve, sozinho, para estudar em Lisboa?
Eu com 15 anos era uma criança muito ingénua. Foi uma coragem muito grande por parte dos meus pais, da minha irmã e da minha pessoa. Eles viram que eu tinha talento e perceberam que a minha vida poderia ser realmente no palco.
A sua família sempre o apoiou?
Sim, sempre. Sempre tive o apoio deles, mesmo numa altura em que a dança nos rapazes não era bem vista.
Como é que encarou o tal convite do Carlos Paredes?
Eu nem acreditei. Liguei à minha mãe e ela nem se apercebeu. Só no momento em que eles entraram para assistir ao concerto é que se aperceberam. Eu próprio, só caí em mim quando subi ao palco e estava no meio daqueles músicos todos: Rui Veloso, Luísa Amaro, Carlos Paredes, Mário Laginha…
Foi nesse momento que pensou que era aquilo que queria fazer?
Eu já o sabia. Naquele momento eu vi ali uma carreira, uma hipótese de fazer uma das coisas que eu mais gosto, que é cantar.
Se não tivesse tido o convite, tinha procurado por essa carreira?
Antes desse convite, eu já tinha tido um registo discográfico. No primeiro disco a solo do Rodrigo Leão eu gravei algumas vozes. O primeiro single do disco tinha como vozes principais a minha e a da Teresa Salgueiro. Essa foi a primeira vez que eu tive a noção do que é ter a voz na rádio ou um vídeo no Top+ e fui-lhe ganhando o gosto. Depois é que surgiu o tal convite do Carlos Paredes…
Como foi a colaboração com o Rodrigo Leão?
O Rodrigo é um grande músico com uma carreira incrível. Na altura, ele tinha saído dos Madredeus e alguém falou-lhe de mim. Ele precisava de uma voz diferente e telefonaram- -me. Obviamente, começar a carreira logo com grandes nomes não é para todos e eu sinto-me orgulhoso do que tenho feito e do que já fiz. Tenho orgulho da minha pessoa. O Nuno tem também uma carreira a solo… Antes disso tenho ainda de falar noutras coisas. Depois desse concerto com o Carlos Paredes, o Manuel Paulo – actual compositor e pianista da Ala dos Namorados – ligou-me e disse-me: “lembrei-me de ti e gostava que viesses cantar umas músicas minhas para um projecto futuro”. Ao chegar lá, deparei-me com o João Gil, dos Trovante, e foi nesse momento que surgiu a Ala dos Namorados. Apesar de a ideia inicial deles ser a de gravar um disco com várias vozes, quando me ouviram cantar perceberam que estava ali algo especial.
Sei que a solo fez sucesso no Japão, como foi?
O disco “Respirar”, que continha músicas de vários artistas portugueses e internacionais, estava disponível no Japão. Nesse disco estava lá a Ala dos Namorados.
O maestro Akira Senju, da EMI do Japão, ouviu a minha voz nessa colectânea e ficou apaixonado. Comunicou à minha editora EMI, que me explicou que queriam que eu fosse gravar um tema ao Japão. Só quando cheguei lá é que soube que o single que eu iria gravar viria a ser o genérico de uma telenovela. A música saiu no disco dessa telenovela e o êxito foi tão grande que chegou ao quinto lugar do top japonês. Fiquei perplexo.
Ainda no Japão, trabalhei com músicos extraordinários. O êxito foi tão grande que acabei por ser convidado a gravar um disco de strandarts, com dois temas cantados com orquestra.
Mais tarde, gravo o álbum “Love Letters”, e este veio a ser outro êxito. Posteriormente, a Ala dos Namorados regressa ao Japão e edita lá uma colectânea. A tourné, depois disso, foi incrível. Tínhamos um público que chorava sem conhecer as letras das canções. Essa colectânea, só sai em Portugal, um ano e meio depois, vendendo mais de 35 mil unidades.
Como foi para um português ter sucesso no outro lado do mundo?
Ainda nesse álbum existe uma canção de embalar, que eu canto em japonês. Uma tradutora ensinou-me, eu aprendi e gravei. Foram experiências únicas. Ainda estive lá um mês seguido e acabei por regressar umas seis ou sete vezes depois. Aconteceu lá muita coisa que a maior parte do público português nem imagina. Por exemplo, eu estive em programas de televisão que só a Dulce Pontes e os Madredeus tinham estado.
Qual foi a pessoa com quem mais gostou de cantar na sua carreira a solo?
Gostei de trabalhar com muita gente. Houve muita gente que passou pela minha vida, e com quem eu aprendi imenso fora do palco.
Eu tive o privilégio de cantar, de falar e de conhecer a Amália Rodrigues, uma das minhas grandes referências. Destaco também o Carlos Paredes; o Carlos do Carmo; a Sara Tavares; que é um dos seres humanos mais maravilhosos que já conheci, e a Nelly Furtado, com quem brinquei e saí à noite em Toronto.
Ainda ganhou vários prémios…
Sim, mas o mais interessante foi o que ganhámos em Espanha, no “World Music”. Recebemos o prémio de Melhor Banda Estrangeira.
Para além disso, sempre fui nomeado, durante anos consecutivos, para a prémio da melhor voz, pela “Blitz”.
Qual foi o momento mais alto da sua carreira a solo? E o mais baixo?
Em termos mediáticos foi na altura do “Carta de Amor”. Eu não considero altos e baixos. Há momentos em que as coisas chegam mais facilmente e outros em que não. Depois, há ainda momentos que estamos noutras fases e experienciamos outros momentos musicais. Umas vezes são mais bem aceites do que outras.
Eu não tenho razões de queixa. Eu, e a Ala dos Namorados, estivemos cheios de trabalho mais de 15 anos, e sempre no auge, quer nacional, quer internacionalmente. Nós éramos uma das bandas com mais internacionalizações e eram muito poucas as que chegavam lá fora e à “World Music”. A Ala dos Namorados percorreu o mundo a cantar e a tocar.
Como é ser um contratenor e ter a capacidade de interpretar músicas barrocas, fado, pop…
Ainda hoje, quando me pus a vocalizar, deparei-me com a minha voz, novamente, mais subida. As vozes também têm fases e vão mudando ao longo dos anos. O engraçado é que a minha voz parecia que estava mais presa. Nos dias de hoje, os meus agudos estão a voltar em grande.
É bom ter esta versatilidade na voz, porque dá a possibilidade de explorar muita coisa. Agora, por exemplo, gostava de trabalhar na música barroca.
Como encarou o convite do João Gil e do Manuel Paulo para se formar uma banda?
O João Gil é um dos maiores compositores da música portuguesa, quem é que não ficaria nervoso ao receber um convite daqueles?
Na altura tinha consciência de que se estava a formar uma das maiores bandas portuguesas?
Não foi fácil. Quando a Ala dos Namorados surgiu, houve quem amasse e houve quem detestasse. Isto, por causa da diferença, da minha imagem e da minha voz muito andrógena.
Hoje em dia tenho muito orgulho porque eu trouxe o sexismo, o confronto da sexualidade e a diferença em todo o seu conceito.
A minha voz era diferente de tudo o que já existia, foi um choque. Contudo, talvez tenha sido por causa dessa diferença, que hoje, passados 25 anos, ainda cá estamos. Hoje em dia é tudo muito efémero. As pessoas não procuram originalidade. E nós lutámos sempre por nos mantermos fiéis à nossa sonoridade, aquilo que nós somos, à nossa portugalidade. É aí que nós tentamos sempre marcar a diferença.
Porquê o nome Ala dos Namorados?
Quem teve a ideia do nome foi um amigo nosso, o músico António Avelar Pinho, que escreveu grandes êxitos das Doce. Ele era manager nessa altura, teve conhecimento do nosso projecto e surgiu-lhe a ideia de “Ala dos Namorados”. Nós tínhamos uma lista enorme, mas escrevemos esse nome e fomos eliminando os outros. Depois de investigarmos o significado do nome Ala dos Namorados, descobrimos que tem uma carga romântica, histórica e portuguesa muito grande. Nós somos também assim. A Ala dos Namorados foi uma das alas da Batalha de Aljubarrota, na técnica do quadrado. Eram os cavaleiros jovens que dedicavam as lutas às suas damas. É também, por esse motivo, que o segundo disco da banda se chama “Por Sua Dama”.
A Ala dos Namorados viajou pelo mundo inteiro…
França, Alemanha, Bélgica, Itália, Grécia, Japão, China, Espanha, Brasil. Todos os meses eu estava em sítios diferentes. Houve mesmo alturas que estávamos quase um mês fora. Eu quando não estava em casa há mais de um mês começava a perder a cabeça, mas era muito divertido. Eu era o miúdo da banda, no meio já de “grandes”. Quando entrei na Ala dos Namorados tinha 19 anos e comecei logo a viajar. Aliás, o primeiro espetáculo da banda, mesmo antes de sair o primeiro disco cá em Portugal, foi na Bélgica.
Foi esse o seu momento mais alto com a banda?
Um dos mais marcantes foi de certeza. Para mim, o mais alto foi cantar para a Amália Rodrigues. Outro dos momentos mais altos foi quando, há quatro anos, cantei com o Carlos do Carmo, os “Mistérios do Fado”, no disco “Razão de Ser”. Eu tive muitos momentos altos.
Também o cantar com a “minha” Sara o “Solta-Se o Beijo” em 1999. Foi um dos maiores êxitos que, hoje em dia, toda a gente canta. Em 1999, a música tocava em todas as rádios. Nesse ano fizemos mais de 60 concertos e no ano seguinte aumentámos o número. A Sara é das pessoas mais especiais que já conheci em toda a minha vida.
E como foi com o Carlos do Carmo?
O Carlos do Carmo é uma pessoa frontal. Tem um sentido de vida muito grande e um carácter muito forte. Ele tem aquela voz e canta as palavras de uma forma muito especial, que chega mesmo às pessoas, tal como fazia Amália Rodrigues. Hoje em dia canta-se, agora cantar palavras de uma forma bonita, vocalmente expressiva e de maneira a que chegue mesmo às pessoas não é para todos, só para alguns.
Também conheceu a Cesária Évora…
Sim, há 14 ou 15 anos, a Ala dos Namorados fez a primeira parte do concerto da Cesária, no Olympia, em Paris. Isto, numa altura em que poucas pessoas iam ao Olympia. Pensando bem, já fiz muita coisa…
Da actualidade há alguma voz que o Nuno aprecie?
António Zambujo, Miguel Araújo, a Márcia…
Em 2008 a banda anunciou uma parragem…
Sim, nós precisavamos disso. Foram muitos anos juntos, estávamos constantemente a viajar, foram muitos concertos e chegou aquela altura em que nos fazia bem respirar…
Respirar uns dos outros ou do trabalho?
Respirar de tudo. Eu quis experienciar outras coisas. Nessa altura dei aulas, fiz outros discos, cantei de outras formas. Dediquei-me à minha vida pessoal. Foi bom e foi mau. Não precisaríamos de quatro anos, se calhar dois anos chegava.
Sentiu falta?
Senti, não digo que não. A Ala dos Namorados marcou e vai marcar-me sempre. Eu chamo a Ala dos Namorados de minha mãe da música, a base de tudo. É normal que eu sinta a falta, é o meu bem mais precioso.
A vossa tour dos 25 anos já começou em Fevereiro, como está a correr?
Este ano optámos por fazer só alguns concertos grandes, como os dos Coliseus e o de Loulé a 4 de Agosto. Vai ser mesmo muito especial e queria os algarvios todos presentes no Largo Engenheiro Duarte Pacheco.
O palco foi feito quase propositadamente para esse espectáculo. Vai ser único. Vai ter a Orquestra Clássica do Sul e muitos convidados, como a Sara Tavares, os Shout e o Vitorino. Vai ser um concerto diferente, na minha cidade, na minha região, único. Os bilhetes estão à venda a partir do dia 9 de Julho.
Após esta tour quais são os planos da banda para o futuro?
Eu acho que a ideia, para estes concertos grandes é a de gravar, com mais três ou quatro temas inéditos. É a de fazer um disco, de comemoração dos 25 anos, com os temas cantados ao vivo. Depois, vamos pensar nas possibilidades.
Eu também tenho um projecto, que penso que será o meu futuro e que dará longevidade à minha carreira. Será aquilo que eu sempre fui e que aprendi a ser com a minha mãe e com a minha irmã, o fado. Muitas pessoas gostam de me ouvir a cantar fado. O próprio Carlos Paredes picava- -me na altura para eu cantar fado. Não vou abrir o leque, mas é uma das possibilidades da minha vida.
E a Ala dos Namorados sempre. Não posso dizer que a Ala dos Namorados vá acabar, sempre que houver possibilidade de nos juntarmos e de trabalharmos juntos, irá acontecer. O facto de eu querer fazer algo a solo, não colide com a existência da Ala dos Namorados.
Deve ter muitas histórias para contar com 25 anos de carreira…
Houve um concerto, na Festa do Avante, com mais de 50 mil pessoas. Eu estava a cantar o “Perdidamente” e, de repente, deixo de cantar, sento-me no palco e calo-me. A imagem que eu tenho, das pessoas cantarem o refrão várias vezes, e eu simplesmente de olhos fechados, é algo que nunca vou esquecer na minha vida.
Outro momento que me marcou muito foi em 2012, quando cantei o “Caçador de Sóis”, com os Shout, na Gala da TVI. Quem tomar atenção à minha entrada, percebe que eu estou como que a dizer: “olá a todos, a Ala dos Namorados está de volta”.
O Nuno lida bem com a pressão?
No início não lidava e pensei em desistir várias vezes. Passar do anonimato para as pessoas me conhecerem na rua e terem sempre algo a apontar, não é fácil. Nos dias de hoje já pouco me importa, porque as pessoas vão criticar sempre, por tudo e por nada. Eu vivo a minha vida praticamente como quero, não deixo de ser eu por causa de ser a figura pública. Não vou deixar de ser eu. No dia em que deixar de ser eu, deixo de cantar e canto apenas para os meus amigos.
Alguma vez pensou em desistir de cantar?
Claro que sim. À parte de tudo o que é bom, de tudo o que é fantástico, há coisas más. Há muito mais coisas boas do que más, mas é preciso ter um grande estofo. Então neste país é preciso ter muito estofo para conseguires manter o patamar em que estás e para ganhares o respeito das pessoas. Podes ter feito muita coisa boa e estares lá em cima e, de repente, esquecem-se de tudo o que já fizeste de bom e só se lembram do menos bom. É duro, não é para todos.
Sente-se realizado a nível profissional?
Claro que sim. Mas quero fazer muito mais.
O que é que lhe falta fazer?
Falta tanto. Sinto-me ainda capaz de muita coisa. A vida fez-me sofrer, mas fez-me crescer e tomar noção do que gira à minha volta, fiquei mais consciente.
Agora, sinto-me preparado para este meu novo projecto. Quero agarrar ainda mais a Ala dos Namorados e as aulas que vou voltar a dar. Estou mais maduro e sinto-me um homem preparado para muita coisa. Hoje, gosto mais de mim.
Tem consciência que a sua voz é única em Portugal?
Há uma voz que é parecida com a minha, a do FF. Ele tem um vozeirão e é das maiores vozes neste momento. Em Portugal temos boas vozes.
Sente que Portugal é um bom país para se fazer música?
Claro que sim. Eu sou muito nacionalista. Portugal é bonito, é um país pacífico, com uma beleza única em todo o lado e com uma história incrível. Eu acredito muito no nosso país e nós ainda vamos dar muito ao mundo.
É fácil fazer música cá em Portugal?
Não é fácil e nos dias de hoje mais difícil é. Há tanta coisa que só alguns é que surgem. Nós devemos todos acreditar em nós e dar mais valor à Arte em Portugal.
Sente-se valorizado pelos portugueses e pelos algarvios?
Sim. Eu costumo dizer que aqueles que realmente gostam da música a sério, que gostam de música portuguesa com muita qualidade e rigor, valorizam-me.
O que é que o Algarve representa para si?
Casa, origem, infância, mudança e uma eterna saudade. Eu estou a adorar viver em Setúbal, mas sabe sempre bem voltar a casa. A minha família e as minhas raízes estão cá, por isso eu vou voltar sempre. Não sei se volto a viver cá, mas que vou cá voltar sempre, isso vou.
(Maria Simiris / Henrique Dias Freire)