São 10 da manhã na Universidade do Algarve. O recinto está repleto de jovens apressados, no entanto, nem só de jovens estudantes se faz a Universidade do Algarve. Entre eles, encontram-se também estudantes com idades para serem seus pais.
Os Serviços Académicos da UAlg adiantaram ao POSTAL que, no ano letivo de 2017/2018, 8008 alunos formavam a Universidade do Algarve. Luís Filipe e Manuel Manero são dois dos 486 alunos com mais de 40 anos que, nesse mesmo ano letivo, faziam parte da academia algarvia. O POSTAL foi ao seu encontro. Luís Filipe tem 46 anos, é natural do concelho de Loulé, é casado, tem dois filhos e está neste momento a estagiar para terminar o curso de Turismo. Já Manuel Manero está a meio da sua licenciatura. Aos 43 anos, Manuel desloca-se mais de 100 quilómetros para frequentar as aulas do curso de Ciências da Comunicação em Faro, deixando as duas filhas e a mulher em Vila Real de Santo António.
Ambos têm razões similares que os motivaram a ingressar no ensino superior e concluir os estudos. São maioritariamente as questões profissionais que os levaram a tomar esta opção. “O principal motivo foi a necessidade que tenho em termos profissionais para poder dar o passo à frente. Eu também sou formador e professor. Para poder assumir outro tipo de projetos faltava-me a certificação em termos de percurso académico concluído numa licenciatura”, explicou Luís Filipe. Acrescentou, ainda, que “[esta licenciatura] possibilita-me uma abordagem mais fundamentada quando estou a dar aulas, quando estou a dar formação, quando estou a dar consultadoria”.
Sem licenciatura, consegui lá chegar mas foi um processo mais penoso
Manuel Manero disse ao POSTAL que, hoje em dia, é preciso ter uma licenciatura para ser ouvido e essa foi uma das suas razões. “Sempre me vi como o principal ator da minha vida. Sempre foi difícil tentar chegar a outros patamares de comunicação, nomeadamente na parte empresarial, porque não temos uma licenciatura. Eu sempre senti que consigo lá chegar, mas é um processo mais penoso”. Desabafou, ainda, que “queria tocar essas pessoas, esses empresários e, às vezes, não existe a mesma credibilidade porque não tenho um canudo”.
No que toca a receios e medos, Luís Filipe contou ao POSTAL que “o receio principal que se prendeu foi considerar-me sequer capaz de poder enfrentar uma realidade de estudo aprofundado, principalmente em termos académicos, de ser capaz de fazer um percurso universitário onde o interregno entre o intervalo escolar foi longo. Felizmente, veio a comprovar-se o contrário”. Luís Filipe afirmou, ainda, que “felizmente veio a comprovar-se que todo o percurso profissional, toda a experiência que se vai acumulando ao longo dos anos, entrando nesta vida do ensino, nos prepara de uma forma completamente diferente daquela que eu estava à espera, ou seja, foi uma surpresa muito agradável que isto tudo resulta. Resulta, enriquece e é um percurso que vale a pena ser feito”.
Manuel Manero diz que não se arrepende de ter tomado este rumo aos 43. “Não me arrependo de não ter entrado mais cedo. As coisas têm um timing para acontecer, se tivesse entrado com 20 não tirava o partido que estou a tirar agora”, acrescentando ainda que “isto é um desafio constante porque depois existem vários estigmas que se formam. Por exemplo “sou demasiado velho para estudar”, como se existisse um prazo de validade. É uma questão de experienciar, não há idade, não há validade”.
A pessoa aos 40 tem muito mais maturidade
Uma das vantagens que o estudante também ressalta em entrar na universidade aos 40 é que, “a pessoa aos 40, tem muito mais maturidade e está muito mais preparada para receber um ensino do que aos 20. Aos 20 tenho mais tempo, mas não tenho a maturidade, essa gestão ainda não esta formatada. Aos 40 tenho menos tempo, porque tenho uma vida muito mais preenchida, mas consigo gerir muito melhor essa informação”.
No que diz respeito ao trabalho com pessoas da idade dos filhos, Luís Filipe contou ao POSTAL que “é muito interessante trabalhar com pessoas mais novas, com pessoas da idade dos meus filhos, principalmente pela parte criativa, porque não há vícios de fora. Como não há o impacto da experiência profissional e de vida que se traz de fora, é muito curioso darmos aso à criatividade de quem ainda não tem este contacto com a realidade e tentarmos depois dar-lhe a volta na aplicação prática. Nunca senti que era o ‘cota’, o ‘pai’”.
Manuel Manero deixou, ainda, um apelo: “venham conhecer, arrisquem, não há desculpas, não se escondam atrás de um número que é a idade, nada nos impede. O difícil é entrar, depois vamos fazendo. Não há melhor e mais bonito que o conhecimento, o confronto com várias realidades, é o que nos faz crescer e desenvolver”.
(Eunice Silva / Henrique Dias Freire)