Portugal enfrenta uma tempestade demográfica perfeita: uma população cada vez mais envelhecida, uma crise habitacional que sufoca os jovens e, agora, alterações à lei do trabalho que prometem precarizar ainda mais a vida de quem ainda ousa sonhar com um futuro.
Os dados são claros: a taxa de natalidade está em queda livre e a idade da reforma sobe. Em 2026, será preciso trabalhar até aos 66 anos e 9 meses. Mas quem irá sustentar este sistema daqui a 20 ou 30 anos, se os jovens não têm condições para constituir família?
Encontrar casa tornou-se um pesadelo. Os preços dispararam, as rendas são incomportáveis e os programas públicos de apoio à habitação acessível são lentos e insuficientes. O novo pacote legislativo “Trabalho XXI” traz medidas que, sob o pretexto de modernizar, acabam por fragilizar ainda mais os vínculos laborais. O regresso do banco de horas individual, a limitação da dispensa para amamentação e a obrigatoriedade de trabalhar ao fim de semana mesmo para pais são apenas alguns exemplos. Como pode alguém planear ter filhos num cenário destes?

Jurista
Trabalhar não deverá ser sinónimo de precariedade, viver sinónimo de sobreviver, e ter filhos não deverá ser um luxo reservado a poucos
Constituir família em Portugal tornou-se um ato de coragem — ou de imprudência. Sem estabilidade laboral, sem acesso à habitação e com políticas que ignoram as necessidades dos pais, os jovens são empurrados para a emigração ou para o adiamento indefinido da parentalidade. E o país paga o preço: menos crianças, logo menos futuro para ele.
Trabalhar não deverá ser sinónimo de precariedade, viver sinónimo de sobreviver, e ter filhos não deverá ser um luxo reservado a poucos. Sem políticas que promovam estabilidade, habitação acessível e apoio à parentalidade, Portugal continuará a envelhecer — até se tornar irreconhecível.
Indicadores demográficos de envelhecimento em Portugal
• Índice de envelhecimento: Em 2024, havia 184 idosos (65 anos ou mais) por cada 100 jovens com menos de 15 anos, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE). Este valor tem vindo a aumentar consistentemente ao longo da última década.
• Número médio de filhos por mulher: Em 2024, o número médio de filhos por mulher em idade fértil caiu para 1,40, abaixo do nível de reposição geracional (2,1).
• Saldo natural negativo: Portugal registou um saldo natural de -33.732 pessoas em 2024, ou seja, houve mais mortes do que nascimentos.
• Projeções para 2100: O INE estima que, até ao final do século, Portugal terá mais de 400 idosos por cada 100 jovens em regiões como Madeira, Açores e Norte.
• População idosa em crescimento: O número de pessoas com 65 ou mais anos deverá passar de 2,6 milhões para 3,1 milhões até 2100, enquanto o número de jovens até aos 15 anos cairá de 1,4 milhões para menos de 1 milhão.
Fonte: Instituto Nacional de Estatística (INE), PORDATA e projeções demográficas até 2100. Dados consultados em novembro de 2025.
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