A recente aprovação do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro, Lei dos Solos, trouxe alterações significativas ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT) em Portugal, permitindo a reclassificação de terrenos rústicos para urbanos com o objetivo de aumentar a oferta habitacional. No entanto, esta medida tem gerado uma onda de críticas devido aos potenciais impactos ambientais, sociais e económicos.
O que prevê a nova legislação?
A principal mudança introduzida pela nova lei é a possibilidade de reclassificação simplificada de terrenos rústicos para urbanos, desde que destinados à habitação, como explica o Ekonomista. Esta decisão passa a ser da responsabilidade das câmaras municipais, dispensando a aprovação central. O Governo argumenta que esta descentralização permitirá:
- Facilitar a construção de habitação acessível para a classe média;
- Promover a equidade social, com preços controlados;
- Aumentar a oferta habitacional em áreas de elevada procura.
Para garantir equilíbrio, a lei impõe que pelo menos 70% das áreas de construção nos novos projetos sejam destinadas a habitação pública ou a preços moderados. Além disso, a legislação proíbe construções em zonas de elevado risco ambiental, como áreas protegidas pela Reserva Ecológica Nacional (REN) e pela Reserva Agrícola Nacional (RAN). Contudo, terrenos com aptidão agrícola moderada ou condicionada e locais com riscos de erosão ou drenagem comprometida podem ser urbanizados.
Controvérsias e críticas
Apesar das intenções do Governo em resolver a crise habitacional, a nova Lei dos Solos tem gerado controvérsia. Especialistas e ambientalistas apontam para possíveis consequências negativas:
1. Especulação imobiliária
A flexibilização na reclassificação de terrenos pode valorizar imóveis rústicos para fins imobiliários, afastando-os de usos produtivos, como a agricultura.
2. Impactos ambientais
Organizações como a Quercus e a Zero alertam para os riscos de urbanização descontrolada, que pode agravar a crise climática e causar perda de solos agrícolas fundamentais.
3. Crescimento desordenado
A Rede H e outros grupos críticos apontam que a medida pode levar à fragmentação territorial, prejudicando centros urbanos consolidados e promovendo a expansão periférica desorganizada.
Riscos associados
A nova legislação elimina a exigência de comprovar a sustentabilidade económica e a indisponibilidade de solo urbano antes de reclassificar terrenos rústicos. Isso pode resultar em:
- Urbanização desordenada, com fragmentação de paisagens rurais essenciais;
- Redução da segurança alimentar devido à conversão de solos agrícolas produtivos;
- Impactos ambientais irreversíveis, especialmente em áreas já vulneráveis.
Soluções alternativas
Críticos da medida sugerem alternativas mais sustentáveis, como:
- Reabilitação de imóveis devolutos em centros urbanos;
- Reconversão de edifícios comerciais e de escritórios para habitação.
Organizações como a Liga para a Proteção da Natureza (LPN) defendem uma maior aposta na reabilitação urbana, que combina sustentabilidade com um uso mais eficiente do solo existente.
O futuro da legislação
O diploma está agora em fase de apreciação parlamentar, podendo sofrer alterações ou mesmo ser revogado. O debate sobre a gestão territorial e a acessibilidade habitacional permanece aceso, com opiniões divergentes entre os que veem a lei como uma solução urgente para a crise de habitação e os que alertam para os seus potenciais efeitos negativos.
Embora a medida vise aliviar a pressão sobre o mercado habitacional, os desafios de garantir equilíbrio entre acessibilidade, sustentabilidade e um ordenamento territorial responsável colocam a nova Lei dos Solos no centro de uma discussão fundamental para o futuro do país.
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