O projeto promovido pela Oceano Fresco começou a ser instalado em junho de 2020 e representa um investimento de 3,1 milhões de euros, assegurado por fundos comunitários do Programa MAR 2020, por capitais próprios e ainda com recurso a uma plataforma de financiamento colaborativo através de empréstimo (‘crowdlending’).
Quem de Lagos olhar para o mar, não vislumbra que a três milhas (5,5 quilómetros) estão instalados o equivalente a cerca de 100 campos de futebol (100 hectares) de cabos, boias e lanternas prontos para produzir pela primeira vez em Portugal amêijoa em mar aberto, naquele que os promotores apelidam de maior viveiro de amêijoa da Europa.
As boias amarelas que sinalizam a zona definida pelo Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo para a produção de bivalves apenas são visíveis ao olho menos treinado nas observações de mar quando o barco se aproxima. É nessa altura que as centenas de boias pretas que mantêm a flutuabilidade da estrutura parecem vir ainda mais à superfície, permitindo uma visão da sua real dimensão.
Com 1.500 metros de comprimento por 750 de largura e muitos quilómetros de cabos, o viveiro já recebeu os primeiros inquilinos e deverá ter as primeiras amêijoas “a sair lá para dezembro”, revela o gestor do viveiro, Rodrigo Clímaco, guia desta primeira visita da comunicação social ao local.
Junto a uma das linhas (cabo que suporta as lanternas) está um barco com 12 metros de calado aberto, com três funcionários a operar a grua, que lhes permite elevarem as estruturas de cultivo e examinar o estado das amêijoas e do seu crescimento.
À chegada da Lusa é erguida uma lanterna para inspeção e antes que a rede seja aberta, é facilmente visível uma variedade de pequenos animais que a povoam e que tiram partido de uma superfície de fixação que antes não existia ali.
“Estamos a produzir amêijoas mas também a dar a possibilidade de outras espécies se fixarem e fazerem aqui a sua vida, algo que não nos incomoda e até é agradável, ver a vida que se desenvolve aqui à volta”, assume Rodrigo.
Anfípodes, poliquetas, cracas, mexilhões e ouriços-do-mar são alguns dos organismos que passaram a fazer desta estrutura a sua casa, às quais se juntam as que deles se alimentam.
“Cria-se aqui um ecossistema, um recife, onde antes não existia nada. Aliamos a produção com a vida natural”, destaca.
A navegação e a pesca estão interditadas na área, mas Rodrigo defende que toda a estrutura funciona como “uma maternidade” permitindo que “o peixe cresça e saia”, contribuindo para o aumento de pescado.
As lanternas são colunas com cerca de três metros de altura e meio metro de largura, forradas com rede e com vários andares quadrangulares onde são colocadas as amêijoas a crescer. A largura da rede dita o “tamanho e a quantidade de bivalves” a colocar, que vão passando da mais estreita com “90 micrómetros” até à de “um centímetro”.
Nesta altura há “150” destas estruturas dentro de água e “mais 100” se vão juntar “até dezembro”, numa previsão de “4.000 dentro de um ano”. Quando a estrutura estiver em total produção “serão cerca de 10.000”, refere aquele responsável.
Do interior da lanterna que aguarda a inspeção no barco, o biólogo marinho retira uma mão-cheia de pequenas amêijoas com dois centímetros, revelando que o crescimento tem estado a “correr bem” e que a sobrevivência no mar “está acima do esperado de 70%, chegando aos 90%”.
Para alcançarem estes valores contam com a “vasta experiência” dos “quatro funcionários” efetivos, com a previsão de “12 daqui a um ano”, mas a localização do viveiro também faz a diferença.
O Barlavento algarvio (zona oeste) é “muito rico em plâncton” – pequenos animais e algas dos quais os peixes e os bivalves se alimentam –, o que ditou a escolha do local, à qual acresce a temperatura e salinidade da água, “ideais para o seu crescimento”, adianta.
O responsável aponta ainda que a baía de Lagos tem também a “vantagem” de ser uma área onde o mar “é mais ameno que a costa oeste [Vicentina] – também muito rica em alimento”, permitindo “ir mais vezes ao mar” e com melhores condições para trabalhar.
Este é um processo que começa quase a 300 quilómetros de distância, na maternidade da empresa no Centro Biomarinho da Nazaré, onde o processo de reprodução da amêijoa macha ou judia (‘Venerupis pullastra’) acontece.
Depois de induzida a postura e criadas as “sementes” – amêijoa com três a quatro milímetros – são transportadas para o Algarve e colocadas no viveiro.
A espécie para cultivo também foi criteriosamente escolhida, tendo em conta o domínio do seu ciclo e o facto do conteúdo de carne ser “mais estável mesmo depois da desova”, mantendo a “sua estrutura e mais carne” ao longo do ano, sublinha.
A visita ao viveiro é acompanhada pelo cofundador da plataforma de financiamento colaborativo GoParity que tem colaborado com a empresa nos diversos passos do seu desenvolvimento.
Manuel Nina anuncia que a plataforma “irá lançar na próxima semana” mais campanhas de financiamento colaborativo para a Oceano Fresco, com o objetivo de angariar “um total 350 mil euros”, que visam “apoiar a investigação científica que a empresa está a desenvolver na maternidade na Nazaré”.
O ‘crowdlending’ é uma opção de financiamento onde empresas e pessoas podem “investir e emprestar dinheiro, com juros definidos a uma empresa ou instituição para desenvolvimento de uma atividade”, esclarece.
O primeiro aconteceu em junho de 2020 e tem contribuído “em cada passo da sua instalação, tanto dos viveiros com da evolução da maternidade”, num total de “730 mil euros” angariados em “7 campanhas”.