Têm os queridos leitores e participantes do Café Filosófico insistentemente pedido para aprofundar temas de filosofia oriental. Muito me compraz satisfazer este desejo, permitindo- me assim falar de Tara, a versão feminina de Buda, a quem os tibetanos consideram “mãe de todos os Budas”.
De acordo com a filosofia budista existem 21 emanações de Tara, cada uma de sua cor e com características específicas. Hoje falarei apenas da Tara Verde, conhecida como Buda da Actividade Iluminada. Ela supera obstáculos e salva os seres de situações perigosas. Tara significa precisamente “aquela que salva”. A sua compaixão para com os seres vivos e o seu desejo de os salvar do sofrimento diz-se ser ainda mais forte do que o amor de uma mãe pelos seus filhos.
A Tara Verde é representada com um brilho transparente e radiante como a mais pura esmeralda e sorri pacificamente. A sua mão direita repousa no joelho direito, enquanto a mão esquerda segura com o polegar e o dedo anelar o caule cuja flor azul, completamente desabrochada, se situa ao nível do ouvido esquerdo. Um disco lunar de tom alaranjado irradia da sua cabeça formando um círculo a partir da base dos seus ombros. Veste uma saia de tecidos azuis e alaranjados presa com uma fita e laço amarelo em redor da cintura baixa. Lenços e um pequeno manto branco bordado está colocado sobre os seus ombros. Está adornada com jóias: colares, várias pulseiras nos pulsos e tornozelos, brincos e o cabelo preso no topo da cabeça por uma grande gema está adornado com flores frescas. O resto da cabeleira flui livremente pelas suas costas. Nada é deixado ao acaso nesta representação: os olhos de Tara representam insight e competência; os braços e as pernas são os quatro incomensuráveis que formam parte do treino de aspiração a bodhichita: bondade amorosa; compaixão; alegria; equanimidade. A face representa a esfera singular da dharmakaya, a verdade que se encontra para além do entendimento conceptual, aquela verdade que apenas a mente búdica consegue aceder.
Dos muitos atributos simbólicos da Tara Verde, aquele que mais me chamou à atenção é que ela é dinâmica – é por isso que seu pé direito já está fora da posição de pernas cruzadas, saindo de padmasana – Tara está a pôr-se de pé para ir ajudar os seres que sofrem. Pratica-se meditação sentado na almofada para ganhar capacidades para verdadeiramente interceder para o bem de todos. A prática de Tara não é apenas meditação; Tara é acção!
Importa esclarecer que o Budismo é uma filosofia e não uma religião, como algumas pessoas tendem a pensar. Numa religião existem deuses, no budismo não existem deuses que devamos adorar ou glorificar. De acordo com o pensamento budista, a natureza búdica é algo que todos temos dentro de nós e que podemos desenvolver. Os seres iluminados são seres que conseguiram alcançar essa natureza búdica. Aliás, “alcançar” talvez não seja a melhor palavra para nos referirmos ao que aqui está em causa, a natureza búdica não se alcança, desoculta-se! Ela existe em todos nós mas está encoberta por camadas de pensamentos e emoções negativas: medos, raivas, todo o tipo de sofrimento, etc… À medida que vamos conseguindo acalmar e limpar a nossa mente, essa fonte de luz começa a emergir. Tal como uma jóia magnífica que tenha permanecido muitos anos no fundo de um pântano fica cheia de lama só mostra o seu brilho depois de limpa, assim também a natureza búdica só brilha quando desvelada.
Tara no seu corpo esmeraldino adornado de jóias representa a mente pura e livre e encarna todas as qualidades e emoções positivas. Visualizar a imagem de Tara, acalma a mente, entoar o seu mantra dispõe-nos para a meditação. Existe um manancial de técnicas e exercícios muito práticos que podemos realizar para atingir o objectivo que nos propomos!
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(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de Novembro)